terça-feira, 25 de novembro de 2014

Conformismo | Subserviência | Medo

Conformismo

 Subserviência                   Medo


Ao tirar-se um instantâneo da sociedade portuguesa fica sempre a noção de que o conformismo é um dos 3 vergonhosos pilares que a sustenta. Os outros são a subserviência e o medo, os quais, obviamente, andam todos de mão dada.
Numa época em que nos acenam com o papão dos mercados, com a certeza da incerteza, com a precariedade instituída, mais vale, se calhar, contentar-nos com o pouco que nos resta. Fazer como o passarinho que saltita pelo asfalto em busca daquela migalha perdida e depois esvoaça para o ramo mais próximo, para cantar vitorioso mais um dia de alegre sobrevivência. Sim, sim… Mais vale ser como o passarinho, porque raposas já há por aí muitas e nós não temos matreirice suficiente para chegar a esse nível.
Ora, a secular teoria de que mais vale estarmos contentes com o que temos e não levantar muitas ondas é quase tão antiga como o próprio país e tem raízes numa religião que sempre incitou este tipo de comportamento, para na retaguarda ostentar a riqueza arrecadada pela perpetuação da miséria. Numa visão mais recente, sabemos que os 48 anos da longa noite apenas aprofundaram estes tipos de sentimentos nos portugueses. Nessa época, a cultura de subserviência foi aprimorada elegendo-se uma certa casta a que todos prestavam vassalagem e era um sem fim de Senhor Doutor para aqui e de Sua Excelência para lá. Incrivelmente, essa cultura persiste nos tempos que correm e é até adoptada por gerações mais novas, gerações nascidas da Liberdade, mas que se calhar nunca foram educadas sem grilhetas.
Durante a longa noite foi também tomando conta o medo. O medo do não haver para comer, o medo da constante perseguição, o medo dos ouvidos nas paredes e o medo de em cada amigo ter um bufo. Esta rede montada em regimes autoritários deixa semente e ainda hoje se vê que é desporto nacional a maledicência, a inveja, a cobiça...
E o medo continua à espreita em cada esquina. Porque podemos perder o emprego ou sofrer novo corte na reforma. Pode acabar-se o subsídio de desemprego ou terminarem com o Serviço Nacional de Saúde. O ensino universal e gratuito pode cessar e sei lá mais que monte de situações podem ser suscitadas pela sublevação das massas.
São estes medos que nos fazem subservientes e conformados com o estado de coisas. São estes os traumas que assombram o subconsciente nacional…
Recentemente, alguém me perguntava se eu tinha consciência que a organização para a qual trabalho era controlada pelo poder político; se era ingénuo a esse ponto... Respondi que apenas era ingénuo até ao ponto de ter plena confiança no meu profissionalismo e trabalho desenvolvido, e que não iria ceder a qualquer tipo de pressão que tentasse incutir-me o medo ou colocar-me numa posição subserviente perante quem quer que fosse. Resposta naïf, evidentemente. Mas a verdade é que esta conversa já decorreu há algum tempo... Ainda não me aconteceu nada; pelo que deduzo que, provavelmente, essa pessoa foi bater a outra porta, que de certeza se abrirá de par em par.
O chorrilho de represálias é infinito. Nós pensamos, refletimos, pensamos um pouco mais e chegamos à conclusão que se calhar mais vale ficarmos quietinhos. Bem ou mal, estes 40 anos de Democracia sempre nos trouxeram alguns “privilégios” (leia-se direitos). Será certamente mais seguro manter as conquistas obtidas, do que lutar pela possibilidade de acrescentar novos direitos. Esta forma de conformismo, que o é efetivamente, deve ser combatida, quer pela resistência interior, quer pela união de todos face ao flagelo da falsa noção de Liberdade, que nos enfardam dia após dia, por todos os sentidos adentro. Com a nossa resiliência poderemos conquistar novas bandeiras, ao invés de permanecer sofregamente agarrados às mesmas.
A verdade é que responsabilizamos as entidades competentes muito abaixo das nossas possibilidades. Reclamamos muito, mas invariavelmente mal. Esperamos sempre que um qualquer messias de dotes sebastiânicos nos retire do bueiro, para onde ele mesmo, numa outra vida, nos atirou. Mas, secretamente, sabemos que tal não vai acontecer... E continuamos presos na nossa revolta. Não saímos à Rua, nem exigimos responsabilidades. Indignamo-nos com o árbitro que “roubou” o penalti à Seleção, ao mesmo tempo que elegemos o autarca que “desviou” fundos do erário público, mas que até vai fazendo obra.
E se o país fechar? O último que apague a luz? Para onde iremos, cidadãos deste Portugal, tolhidos pelo medo, pela subserviência e pelo conformismo? Aí já não haverá tempo para alternativas. Já não haverá tempo para lutar. A austeridade não deixará pedra sobre pedra, do edifício do Estado Social. Aí será tarde demais. O Tempo é AGORA! E é Tempo de Avançar!!!

Montijo, 24 de Novembro de 2014
Miguel Dias
Membro da Assembleia do LIVRE
Subscritor da Convocatória da Convenção para uma Candidatura Cidadã
(www.tempodeavancar.net)

http://diariododistrito.pt/index.php?mact=News,cntnt01,detail,0&cntnt01articleid=2803&cntnt01pagelimit=10&cntnt01returnid=91

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Quando a Esquerda é esclarecida

Quando a Esquerda é esclarecida consegue discernir o que realmente interessa – o consenso em torno dos interesses da população. O diálogo e o compromisso são as armas do progresso. As pessoas certas sentadas a uma mesa redonda, com uma caneta e um papel à frente podem fazer acontecer impossíveis. Nessa mesma lógica, as pessoas erradas podem soltar infernos. Isso fará toda a diferença aquando das próximas legislativas.
As esquerdas têm de compreender, de uma vez por todas, que o interesse geral do povo é mais importante do que qualquer agenda de tacticismo político ou qualquer tipo de sectarismo. Dito de outra forma: as esquerdas têm de entender, que têm de se entender! O preço a pagar por esta falta de compromisso poderá ser demasiado caro, fazendo com que a maioria dos eleitores não o consigam suportar.
Os resultados são evidentes: uma possível nova maioria de direita, com mais quatro tenebrosos anos de austeridade, que já provou o seu fracasso na saída da crise; ou uma hipotética reedição de um Bloco Central, institucionalizando o bipartidarismo, que muito provavelmente teria uma maioria de 2/3, necessária para alterar a Constituição da República Portuguesa – a tal que tem sido a garantia de que esta espécie de massacre nacional não tenha ido mais além.
As esquerdas têm de entender que o falhanço do compromisso e do diálogo não será tolerado pelo eleitorado, que há tempo demais aguarda por uma solução de Esquerda para o Governo nacional. Se a isto somarmos a hipótese da mesma ser ampla e plural, isso trará possibilidades infindáveis. Far-se-á sempre história, mas poder-se-á cunhar na sociedade algumas das bandeiras e ideias de Esquerda sonhadas em Abril, estando muitas em risco, outras longe de ter sido postas em prática. Falo da defesa do Serviço Nacional de Saúde, do Ensino Universal e gratuito, do direito à habitação, do direito ao trabalho digno e com direitos, do combate às desigualdades…
Caso a Esquerda ganhe as próximas eleições com uma maioria de 2/3, pode até por iniciativa própria fazer uma revisão constitucional que proteja ainda mais as pessoas, desta cada vez mais sinistra rede de interesses, que parece querer apostar num modelo de corporativismo, ao invés de um modelo solidário e cooperativo.

Quando a Esquerda é esclarecida une-se para eleger Presidentes da República ou para conquistar importantes Câmaras Municipais às mãos da Direita. Porque não fazer o mesmo para uma solução de Governação do país? Este é o ensejo próprio para se fazer história. Para construir uma real alternativa de governação de Esquerda. Todas as esquerdas estão convocadas para tal desígnio. Não temos o direito de defraudar o desejo da maioria do povo português. Queira desta vez a Esquerda ser verdadeiramente esclarecida.

Montijo
10 de Novembro de 2014
Miguel Dias