terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Educação é Liberdade

Quero continuar a acreditar que é pelas palavras e não pelas balas que se operará a verdadeira revolução. Reside na ponta da caneta e não na ponta do fuzil a capacidade de mudar a sociedade. Para tal a informação deverá ser democratizada e chegar a todos. Não podemos mantê-la como uma coutada, ao alcance apenas de alguns privilegiados com maior formação e mais despertos para as questões políticas e sociais. As reuniões, congressos, debates ou o que for, que se realizam de norte a sul do país, terão necessariamente de extravasar as paredes que as confinam e saltar para o espaço público, formando assim corrente de opinião.
A voz do povo tem de ser a voz da mudança. Mas para que isso surta efeito é preciso formar a população. Não no sentido condescendente do termo, mas munindo-a dos princípios necessários para fazer uma análise crítica e construir uma opinião. A voz isolada de cada um nada consegue. É muda no panorama social. Mas juntando-se cem, mil ou milhão, tornar-se-á no clamor que exigirá uma sociedade mais justa e solidária.
Por isso, nada é tão atentatório da liberdade de um povo e do seu caminho para a construção de um ideal de sociedade mais equitativo, do que a ofensiva que se vem revelando ao Ensino e à Escola Pública. Pondo em causa a educação do povo espera-se criar carneiros sempre prontos a obedecer a meia dúzia de latidos governamentais ou ao cajado de um qualquer pastor troikista, quando o verdadeiro objectivo deveria ser a formação dos homens e mulheres de amanhã, com espírito crítico e atentos à sociedade que os rodeia. Só assim serão verdadeiras mais-valias na evolução do país e no seu desenvolvimento económico sustentado (e sustentável).
A ideia de que precisamos de uma população activa ignorante e mal paga, que sobreviva no limiar da escravidão, fez e faz doutrina entre algumas elites dominantes. Urge quebrar esse vício secular, devendo para o efeito apresentar-se exemplos cabais de que o conhecimento e formação são indiscutíveis trunfos para uma classe trabalhadora mais eficaz. O tão aclamado fenómeno irlandês constituí um óptimo exemplo de um país que, com um ordenado mínimo 3 vezes superior ao nosso e uma mão-de-obra qualificada, está a atrair investimento estrangeiro, nomeadamente no que concerne às empresas ligadas à tecnologia e internet. Por lá fala-se de previsões de crescimento que Portugal nem em períodos prósperos experimentou.
O extinto colectivo musical Da Weasel, oriundo de Almada, cantava no início da sua carreira as seguintes palavras no tema “Educação (é Liberdade)”: 
É mais forte o homem que sabe criar um filho / Do que aquele que apenas prime um gatilho.                        
É mais fácil matar que ler um livro, verdade? / Mas a bala é a prisão, educação é liberdade.”
Não sendo mais que uma metáfora relativa ao abandono escolar e à indigência intelectual, é representativa daquilo que podemos esperar de uma população limitada no seu percurso académico. A restrição do ensino e o pré-condicionamento das escolhas pessoais é feita de inúmeras formas. Através de uma avaliação estúpida da classe docente, da realização de exames nacionais aos alunos, da modificação constante dos programas escolares, do dogma do ensino profissional, do preço dos manuais escolares... Todas estas barreiras têm como objectivo esvaziar a qualidade que, apesar de tudo, se vai reconhecendo ao ensino público e dificultar a progressão e continuação dos estudos. A conclusão do ensino obrigatório (e gratuito!) com sucesso é a qualificação mínima devida a qualquer cidadão, para que este possa estar munido do indispensável para poder pensar o seu país e o mundo de uma forma capaz e coerente. Privar alguém disto é condená-lo a uma espécie de prisão perpétua sem possibilidade de liberdade condicional...
17 de Dezembro de 2013
Miguel Dias

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Os 10 000


Dez mil... Esperem o número assim escrito não transmite a sua verdadeira grandeza. Vou tentar de outra forma: 10 000. Não. Mesmo assim não lhe faz justiça. Talvez 10 000 pessoas?! Sim isso mesmo, 10 000 pessoas; 10 000 portugueses, grande parte jovens licenciados. Esse é o número de cidadãos nacionais que saem todos os meses do país, para tentarem a sua sorte lá fora. E como até agora ainda ninguém se aprontou a negar este indicador parto do princípio que este número é fidedigno.
O surto que agora ocorre não é virgem. Já nos idos de 60 do século passado, o país deparou-se com uma onda emigratória, onde o povo fugia de um futuro já traçado de fome e miséria por aquela longa noite negra que durou 48 anos. Encarava a incerteza com uma mão cheia de sonhos e na outra uma mala de cartão. Hoje os jovens que saem levam a mesma mão cheia de sonhos, mas na outra transportam um canudo. O grau académico que será a sua porta de entrada no mercado de trabalho global. E todos os dias, quem fica, vê partir os melhores da sua geração. Aqueles que poderiam realmente fazer a diferença, contribuindo para um país mais desenvolvido e, quem sabe, mais justo.
É compreensível que as nossas esperanças estivessem depositadas na geração que agora se situa entre os 20 e os 40 anos, pois esta é a geração mais qualificada que alguma vez tivemos. Os diplomas que ostentam foram alicerçados no nosso sistema de ensino e no investimento de todo um país. As próprias famílias investiram e muito na formação dos seus, tentando apetrechar estes com as ferramentas que nunca tiveram. Convencidas que estavam de que, com o amadurecimento da Democracia, o conhecimento e o mérito passassem a ser reconhecidos como atributos essenciais para o desenvolvimento do país. O pior de tudo é que esta leva de emigração não tenciona voltar. Esta geração não faz planos. Saí amargurada com uma sucessão de governos que lhes virou as costas e a abandonou no desemprego, mas que antes a fez passar por estágios não remunerados, recibos verdes e contratos precários.
Evidentemente que o fenómeno do desemprego jovem não é um exclusivo nacional. Em toda a Europa esta taxa é também elevadíssima. Não tenho dúvidas que esta enorme barreira na inserção dos jovens no mercado laboral é em larga medida ditada por uma geração mais velha, aburguesada no poder e que conta com o apoio dos grandes interesses instituídos, graças a uma subserviência intrínseca, que lhe amputou a coluna vertebral mas que lhe valeu umas quantas prateleiras douradas. É também fruto de políticas económicas e de emprego erradas, em que o imediatismo é favorecido em detrimento do sustentável. Quem aponta este rumo não consegue perceber que uma visão sustentável ditará, a médio e longo prazo, um crescimento muito maior e mais eficiente.
A perda para Portugal desta população jovem vai criar um gigantesco problema futuro. Num país já de si envelhecido, a saída daqueles que deveriam agora “iniciar” a sua vida adulta, entrando no mercado de emprego, estabelecendo morada, tendo filhos, contribuindo desta forma para a necessária renovação geracional, bem como incentivando a própria procura interna, será a médio prazo um rude golpe, podendo mesmo, em última análise, abrir um “buraco etário”.
Para a nação poder ter um futuro é essencial inverter o quanto antes esta situação. Caso tal não suceda deixaremos de herança às gerações vindouras um país pobre a todos os níveis – social, económico e cultural.

Miguel Dias
29 de Novembro de 2013

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Génese

Aparentemente existe uma enorme vontade política para controlar e reprimir o direito ao protesto e à indinação, mas curiosamente muito pouca vontade para resolver os problemas reais do país e da sua população. Se isto não é o início de um estado opressor, não sei o que será...

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

LIVRE - Eu anseio ser

         No passado dia 16 de Novembro de 2013 estive presente na acção levada a cabo pelo Manifesto para uma Esquerda Livre. Ouvi e meditei sobre a criação de um novo Partido à Esquerda. Até estive quase para intervir, mas por ser algo impulsivo tenho sempre receio que as minhas palavras possam ser interpretadas erradamente. Aliado a isso, o poder de síntese não é decididamente o meu forte e o tempo, o vosso e o meu, era limitado. Posto isto, e visto ser assinante do Manifesto em cujo conteúdo eu me revejo, decidi escrever umas linhas sobre o assunto, pois consigo sempre organizar melhor as minhas ideias e pensamentos desta forma. Deixo assim o meu contributo, que espero seja acolhido de forma positiva e encarado como uma crítica construtiva ao que se perfila no horizonte – a criação de um novo Partido.

            Por mais de uma vez tentei elencar os prós e os contras da criação de um novo partido de Esquerda. Invariavelmente chego ao fim da listagem empatado. Ainda hoje reflicto sobre essa questão e acreditem que não iniciei esse processo apenas nesse Sábado. A pertinência do seu aparecimento e as linhas mestras que deve seguir são perguntas com as quais me confronto e debato. Ressalvo no entanto que, por princípio, sou sempre favorável à criação de Partidos, até porque os considero agentes vitais no funcionamento das democracias.

            Muita coisa foi dita e muita opinião difundida na reunião do Teatro São Luiz. Foi, por exemplo, dito que é preciso acordar os cidadãos para o activismo político, dentro ou fora dos Partidos. Mais, solicitou-se que os militantes que não se revissem nos seus actuais Partidos, tentassem alterar internamente os mesmos. Isso deixa-me a questão: porquê que Rui Tavares não tentou fazer isso no Bloco de Esquerda, quando afirma sentir-se bem com pessoas do Bloco e com algumas pessoas do PS? Poderá estar relacionado com a apelidada falta de liberdade e de pluralidade que afirma faltar no espectro político nacional? Se for este o caso, sou forçado a concordar com esta posição. Os Partidos da Esquerda nacional são demasiadamente inflexíveis. Passam, a meu ver, para além da coerência, pois só organizações autistas não se apercebem das mudanças na sociedade e da realidade em que o país está inserido, quer no contexto europeu, quer no mundial. Infelizmente ainda é prática comum que vozes dissonantes no interior do Partidos sejam ostracizadas e muitas vezes expulsas dos mesmos. Da Esquerda portuguesa separo o caso singular do PS, que já deu mostras de ser bastante flexível à Direita, mas duma rigidez tremenda no seu próprio “meio ambiente”.

            Entre as muitas intervenções destaco uma que afrontava o Comunismo e apelidava as utopias de perigosas. Evidentemente que sou desfavorável à mesma, até porque esta não será a melhor forma de atingir o intento de unir as Esquerdas. Relembro que não foi o Comunismo que nos conduziu ao estado actual, mas se hoje debatemos a Democracia, muito se deve a esse Partido. É certo que muitas utopias são perigosas, aliás a concretização das mesmas, embora a meu ver mais perigosa é a realidade que vivemos! Estamos numa encruzilhada histórica em termos nacionais e europeus. Interessa pois saber qual o caminho que queremos seguir. Para tal, temos de pensar o que queremos ser enquanto povo e enquanto nação. Que modelo queremos instituir e como iremos lá chegar. Em suma, se queremos manter um Estado Social, pedra angular das modernas democracias ocidentais, que seja forte o suficiente para proteger e cuidar dos mais desfavorecidos ou, em alternativa, se optamos por um Estado de serviços mínimos em que todas as funções possíveis são alienadas aos privados, tecendo estranhas teias de favorecimentos a grandes grupos económicos, que florescem à sombra das contribuições de dinheiros públicos. No fundo se pretendemos ser solidários ou se nos rendemos a uma visão darwinista onde impera a lei do mais forte.

            Se tal premissa é conseguida através da criação de um novo Partido é extremamente discutível. Conquanto a declaração de princípios do LIVRE seja quase impossível de criticar por quem se identifique como sendo de Esquerda, a verdade é que o resultado da génese de um novo Partido político pode resultar, ao invés do desejo de unir as Esquerdas, numa vitória para a Direita, por efeito dos problemas inerentes ao círculos eleitorais e ao método de Hondt. A isto soma-se o facto de ser sempre mais fácil a união à Direita pois, convenhamos, a sua agenda é bem mais pragmática e simplista e seus objectivos muito mais imediatos. Julgo que poderia ser encarada a hipótese deste novo partido participar com listas próprias às eleições europeias e autárquicas e tentar negociar coligação/coligações nas eleições legislativas, evitando a possível perda de deputados parlamentares.

            A Esquerda é mais heterogénea na sua composição. Isso acarreta um desafio muito maior para conseguir a sua união. Mas, numa perspectiva positiva, as divergências de opinião enriquecem também o seu conteúdo programático. Do caldeirão de ideias pode e deve surgir uma Democracia “mais representativa” dos reais anseios do povo. Dessa forma chegar-se-á ao maior número possível de cidadãos. Para tal, não basta pegar em meia dúzia de dissidentes do Bloco de Esquerda e do PS, arremessar um punhado de escorraçados do PCP, juntar cimento e mexer tudo. Não é isso que vai dar coesão a um Partido que se apresenta como uma lufada de ar fresco no panorama político.

            Liberdade, Igualdade e Fraternidade, são os princípios basilares que qualquer Democracia deverá seguir. Se juntarmos a isso a Justiça Social temos a receita perfeita para uma sociedade democrática contemporânea. Numa altura em que o populismo encontra terreno fértil para a sua cruzada demagógica, como em todas as ocasiões de crise e desesperança, um novo Partido deverá vincar a sua diferença relativamente aos restantes. Deve também afirmar-se como acérrimo defensor destes princípios, assegurando que a flexibilidade necessária para criar consensos e unir a Esquerda não pode por em causa os mesmos.

            Por último, apraz-me dizer que um novo Partido deve tentar atrair a enorme maioria de abstencionistas, que não se revê em qualquer grupo político. Para essas pessoas o que realmente importa é a constituição de uma entidade que faça eco das suas angústias e que ouça os seus problemas. Precisam de vislumbrar um destino e uma razão para lutar. Precisam de se identificar com um Partido que, até pelo nome que ostenta, deverá ser o mais aberto possível. Porque o preconceito não encontra quartel na Esquerda! Não podemos esquecer que há gente válida em todos os quadrantes políticos. Há também muita gente decepcionada à Direita, que se afastou da política. Há uma enorme massa que não encontra um significado para todos os sacrifícios que têm sofrido. Há muitos milhares que não sabem sequer se são de Esquerda ou de Direita. Portanto acho plausível que a designação Esquerda possa ser retirada da sigla partidária. Por mim não me choca, até porque não necessito de ser constantemente relembrando daquilo que sou.

            Apesar de todas estas ponderações decidi preencher a pré-inscrição de militante, obviamente pendente dos estatutos do novo Partido ainda por anunciar. Isto porque, independentemente da vontade de dar o meu contributo, nunca tinha encontrado um Partido onde revisse a maioria dos meus valores e linhas orientadoras de vida, como sejam o princípio da solidariedade e o modelo de desenvolvimento sustentável, que deverá sempre equilibrar a visão económica com a urgência ecológica. A Europa e o seu futuro é também um ponto urgente na agenda política. O caminho que trilha conduz à decadência e à extinção do sonho inicial. Não passa de um conglomerado mal-amanhado de nações, onde a única política comum é a ditadura financeira. E, claro está, isso tem repercussões inevitáveis em Portugal, economia marginal no contexto europeu. A sua participação na União é encarada como um favor, ao inverso de ser considerado um membro activo e relevante na sua composição.

            Assim, interessa frisar que só a aposta num modelo de real desenvolvimento do país, onde o principal objectivo seja a redução das assimetrias vigentes, sejam elas geográficas, sociais, ambientais, económicas ou outras, pode conduzir a uma Democracia forte e activa. Para qualquer cidadão ter um pensamento LIVRE é essencial estarmos todos ao mesmo nível, tendo igual acesso aos direitos básicos, como a educação, saúde, trabalho e justiça. Só assim se pode operar a mudança...
  

Miguel Dias
21 Novembro de 2013

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Debate: Grandes manifestações – para que servem?

Foi com uma mente aberta e uma esperança escondida, que esta quinta-feira dia 14 de Novembro de 2013, pelas 21 horas, me desloquei ao debate “Grandes Manifestações – para que servem?”, patrocinado pela Academia Cidadã. Sentei-me entre a plateia, com uma expectativa latente e sedento de algo. Este foi o principal condão que a iniciativa teve, o de me meter a pensar realmente, para que servem as grandes manifestações. Pensei ser possível encontrar respostas, mais do que tentar fazer doutrina. Até porque neste capítulo tinha muitas dúvidas e poucas certezas.

À medida que o debate fluía, emergiam algumas ideias válidas e outras que me adensavam as incertezas. Mas assim é nestes casos, e invariavelmente saímos sempre mais ricos destes encontros, porque mesmo cobertos de incertezas alguém nos desafiou e confrontou o intelecto. É impossível não ganhar neste tipo de iniciativas.
Mas curiosamente deu-me a sensação que o “sectarismo” esteve à solta, não no painel de debate, mas entre os assistentes. Quando a voz passou para o lado de cá dos microfones, as posições extremaram-se, numa plateia que estava claramente faminta de revolução. Esqueceram-se é que o “inimigo” ficou à porta e não se encontrava entre aquelas 4 paredes. Foi evidente a crítica, na maior parte das vezes gratuita, ao papel das organizações que se fizeram representar. Apenas por uma vez me lembro de alguém erguer a voz na defesa e louvor da atitude destas pessoas, que muitas vezes representam os anseios de toda a sociedade expiando os seus medos. Estes actores desempenham um papel fundamental, neste teatro chamado Portugal.

O debate em torno das grandes manifestações e sua inscrição no espaço público quer-se sério e profícuo. Isto não é um concurso. Não se trata aqui de demonstrar que a minha ideia é melhor que a tua. Até porque é de um colectivo que devemos falar. Esse mesmo colectivo que com um objectivo delineado – o fim desta política de austeridade – vem ao espaço público clamar justiça. Até porque em última análise as ideias válidas deixam de ser minhas ou tuas e passarão a ser NOSSAS, adoptadas por um grupo que apenas deseja o melhor possível para cada indivíduo que o compõe.

Logicamente em democracia, ninguém está incólume à crítica e ela tem um valor e espaço próprio que importa manter. Estou perfeitamente consciente que é da discussão das nossas divergências que se geram consensos. Mas a crítica tem de ser construtiva, tal como o diálogo. Muito de útil e produtivo foi dito entre o painel, mas da assistência poucas ideias brotaram, embora as participações tenham sido muitas.

A luta que o país enfrenta não se compatibiliza com o protagonismo ou necessidade de reconhecimento. Todos devemos remar no mesmo sentido, unindo esforços por um objectivo comum. A mudança de paradigma político, que se materializa no fim da austeridade, é a principal meta que almejamos. Parece-me pouco provável que tal suceda sem uma mudança governativa, pois o actual elenco já deu mostras de não conhecer outro caminho. Os erros acumulam-se, mas a receita mantem-se. Falharam-se todos os alvos, mas a austeridade continua a ditar a sua lei. É notório que assim não vamos lá.

E é dentro desta conjuntura que se regista a importância enorme da noção de espaço público e a forma como este dever ser ocupado. Sou apologista de que o mais importante é agir. Não apenas no sentido restrito da “acção mecânica”, pois falar, debater, discutir, também pode ser (é) agir. As grandes manifestações servem precisamente para isso. Para transportar a indignação ao espaço público e criar neste um local de debate, de confronto político e ideológico. Mediatizadas pelo número, transmitem um peso próprio e criam uma influência involuntária junto da sociedade civil. Manifestações como o 12 e Março e o 15 de Outubro de 2011 ou o 15 de Setembro de 2012, dificilmente serão apagadas da memória colectiva e tiveram o mérito de voltar a colocar o espaço público na ordem do dia. Espaço esse que, na sua vertente “Rua”, a CGTP nunca deixou morrer. Alimentando-o quase isoladamente durante anos e evitando a sua desertificação e abandono. Mesmo que de simples desfiles se tratassem, esta acção foi essencial para a manutenção do protesto.

A meu ver, esse quase abandono do protesto deveu-se essencialmente a uma falsa noção de prosperidade que vingou na sociedade. Efectivamente um país que pouco produz e que rifou a sua agricultura, pescas e indústria, dificilmente pode ser próspero. E esta nova prespectiva que se impôs primeiro pelas organizações ditas inorgânicas e depois, de forma quase natural, por todos nós, insiste na participação fundamental da população na vida política como agente activo, exigindo a responsabilização de quem está ao leme da nação. E não é pelo caminho da abstenção eleitoral que chegamos a esse fim. A inércia política e a ausência de escolha, é agora um luxo que está ao alcance de muito poucos.

Uma coisa é certa, este tipo de manifestações inorgânicas, geradas a partir de movimentos mais ou menos organizados, mudou a perspectiva que se tinha destas formas de luta. O “monopólio” sindical do protesto deixou de fazer sentido. Isso é essencial para uma larga franja da população, que já não se revê nos partidos ou nos sindicatos, tal como actualmente os conhecemos, e que adere agora a movimentos que denotam um espírito apartidário e plural, independentemente das pessoas que os constituem.

A participação da sociedade civil como um todo deve também ter expressão no espaço público, que eu entendo de uma forma lata. O espaço público é a rua por onde desfilam as grandes manifestações, carregadas da nossa indignação. É a praça pública onde se gera o debate, é o espaço virtual e as redes sociais que acordam o povo e o mobilizam em prol de um objectivo comum. Mas é também o local de trabalho, o café ou restaurante, o transporte público, a nossa vizinhança, a nossa família. Por vezes a intervenção que se inicia nestes nichos tem uma escalda exponencial, criando verdadeiras correntes.

A importância da conquista e manutenção do espaço público, seja pelas grandes manifestações ou pelas pequenas intervenções, é fulcral. Mas tão ou mais importante é a complementaridade que se exige a todos os movimentos, orgânicos ou não, na persecução do mesmo objectivo – a mudança de rumo. Aí sim, o espaço ocupado será verdadeiramente público, pois congregará em si mesmo toda a heterogeneidade que constitui a matriz social. Só vejo uma forma de isto conseguir ser feito. Através da aliança de todos criando uma onda de fundo na sociedade civil o mais transversal possível, que englobe o máximo de ideologias e crenças. Isto não implica a extinção de qualquer movimento. Todos são válidos. Se alguma coisa deve suceder é a aparição de novos, que mobilizem mais pessoas para o protesto É sabido que são muitos os sectores que se encontram descontentes, porque não tirar proveito disso?

Miguel Dias 2013-11-15

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

Um estado melhor? – o guião para a reforma do Estado

Cheguei à conclusão que devo ter demasiado tempo entre mãos. Isto porque resolvi experimentar a leitura do tão aguardado guião para a reforma do Estado, da autoria de Paulo Portas. A primeira coisa que me passou pela mente foi que teria descarregado um ficheiro pirateado... Aquilo não poderia ser a augurada reforma do Estado. Mas quando reparei que inúmeras personalidades já esgrimiam argumentos na praça pública, a favor ou contra o mesmo documento, percebi que era o autêntico.
Mas isso é acessório, pois já foram largamente difundidas as críticas relativamente ao corpo da letra e ao espaçamento entre linhas e parágrafos. Vamos ao que realmente importa. O documento peca por uma ausência quase total de propostas concretas. Convém esclarecer que a listagem contínua de evidências, não permite a resolução automática dos problemas. A maioria das ideias constantes neste guião, nem sequer é novidade. Funcionam como redundâncias do actual panorama político. Como se repetindo muitas vezes os mesmo erros, e plasmando-os numa folha de papel, eles de repente se corrigissem “milagrosamente”. Parece-me a revelação de uma teoria – a tautologia da evidência do erro. Sim porque o nosso erro tem um objectivo: o fim do protectorado e o regresso aos mercados, ámen!
Independentemente do guião parecer insosso, não significa isto a ausência absoluta de ideias ou princípios. É aliás sagaz na forma como está construído. Inicialmente dá-se a entender como uma proposta aberta, aparentando uma postura de magnanimidade governativa, e apelando ao diálogo com restantes partidos e parceiros sociais. O mesmo que foi vedado durante 2 anos. Lança também o isco para uma próxima revisão constitucional, que estes senhores anseiam com todas as suas forças, embora aparentem uma ilusória descontração nesta matéria. Nada disto me parece um acaso... E à medida que ia avançando na leitura, o meu espírito começou a ser imbuído pelo teor deste manifesto, marcadamente ideológico.
Nesse capítulo, faça-se justiça, este documento vem iluminar o percurso deste elenco governativo, clarificando as opções e os princípios pelos quais se rege. A teoria da inevitabilidade continua vigente, quando às páginas tantas se repete, mais uma vez, a premissa de que não há redução da despesa pública sem cortes nos salários, pensões e prestações sociais. Começa assim a desmoronar-se a falsa humildade revelada no início do escrito, continuando com o apontar de baterias ao governo anterior, tribunal constitucional, oposição, sindicatos, conjuntura nacional e internacional, clima de "crispação política" (detesto este termo), pirâmides etárias invertidas, mercados financeiros, União Europeia, identificando estes agentes como os responsáveis pelos problemas do país e os principais culpados caso o caminho fracasse. É engraçado a menção que se faz às questões etárias e à não renovação geracional, até porque não existe aqui uma única medida de incentivo à natalidade. Pelo contrário, todas as medidas que foram recentemente aplicadas ou que ameaçam ser, resultam numa contração ainda maior da natalidade. O abandono do país pela faixa mais jovem da população activa, também não irá ajudar em nada esta realidade.
Pela proposta afora, várias são as ideias estapafúrdias defendidas, como a relação entre os cortes e o crescimento macroeconómico. Mais uma vez se repete a noção de empobrecer o país, a bem de uma retoma económica que teima em não aparecer. Mas acena-se com a cenoura do fim dos cortes, como se fossem legítimos, quando se iniciar o tal crescimento económico. Fala-se de uma reforma fiscal, mas que por ora só será aplicada ao IRC, ou seja, às empresas. As famílias, Sr. Portas, aquelas que V. Ex.ª enche sempre a boca para hipocritamente defender, agradecem. Mais uma vez se fala da diminuição do número de funcionários públicos, como panaceia para resolver os problemas estruturais do Estado, mas em contraponto afirma-se a necessidade de contratar pessoas com mais formação. Estou mesmo a ver os “tachos” que se avizinham...
Mas como disse anteriormente, o teor marcadamente ideológico deste documento faz-se sentir a cada página. Está bem patente, por exemplo, na defesa da continuação do processo de privatizações, na defesa da política de concessões principalmente dos transportes públicos, na defesa de um modelo fiscal que nos meteu a todos a descontar mais, no aumento do horário laboral, na defesa de uma justiça mais amiga da economia (???), no lançamento de novas PPP’s no ensino em detrimento da escola pública que se verá esvaziada de fundos, logo de qualidade, e onde poderá surgir um novo tipo de cooperativas de ensino, “as escolas independentes”, detidas por professores e alavancadas pelo cheque-ensino, pelo incentivo reforçado às IPSS’s transferindo assim a responsabilidade social do Estado para terceiros, na alienação a privados dos hospitais que se querem públicos, na desistência da nossa indústria naval, na recorrente teoria do plafonamento das pensões abrindo caminho à tão apetecível privatização dos seus fundos, na transferência para a iniciativa privada de certas funções exclusivas (e que assim se querem num estado de direito) das forças de segurança, na extinção das freguesias (meio decisório mais próximo das populações) e no eminente ataque para a congregação de municípios.
Este folheto afirma categoricamente, que não é intenção deste Governo extinguir o Estado Social, que aliás se revê no chamado “modelo social europeu”. Afirma que é por isso mesmo que o está a desmembrar, perdão reformar. Mas diz mais. Diz que este atributo, reformador, é essencial a todas as forças políticas que constituem governos democráticos, do centro-direita ao centro-esquerda (...) confrontados com a crise (...). Ficámos todos a saber que, para este senhor, os governos fora deste espectro partidário ainda que empossados na sequência de eleições, não são democráticos... Ficámos também a perceber que só em tempo de crise é necessário reformar. A meu ver as reformas (no verdadeiro sentido da palavra) ou melhorias (como eu acho que deveriam ser encaradas) devem ser executadas em altura de prosperidade e não de definhamento, onde tudo está esticado de tal forma, que qualquer alteração na equação resulta no hipotético drama social. É o caso do desemprego e dos vergonhosos cortes nas prestações sociais. Um Estado Social forte e saudável faz mais falta à sociedade precisamente em época de crise.
Gosto particularmente do capítulo 2, denominado de “Reformar é diferente de cortar”. No seguimento desse capítulo afirma-se que “Cortar” é reduzir; reformar é melhorar. Portanto quando o Governo diz que é urgente reduzir o número de funcionários públicos está, logicamente... a reformar! Isso mesmo é comprovado pela intenção do lançamento de um PREMAC 2, sigla que significa Plano de Redução e Melhoria da Administração Central. Assim, podemos facilmente chegar à conclusão que, para este Governo, cortar e reformar são indubitavelmente sinónimos!
Em jeito de resumo parece-me evidente que o pretexto de lançar o debate sobre as tarefas que devem caber ao Estado é uma falácia. O que se pretende é arranjar maneira de alienar o máximo possível à iniciativa privada e manter um Estado de serviços mínimos. Atenção: acho plausível que as pessoas defendam esta posição, independentemente de não concordar com a mesma. O que me indigna é a tentativa de disfarçar o que se está a tentar fazer, ludibriando todo um povo e mantendo-o à tona apenas pelo período indispensável para respirar.
Apesar de tudo existem princípios, quase do senso comum, com os quais concordo. Por exemplo, concordo que é preciso desburocratizar, concordo que é necessário, e urgente, despartidarizar a Administração Central, concordo que é preciso desagravar a carga fiscal, concordo com o aproveitamento e a optimização da “função jurídica e contenciosa” dos serviços públicos evitando o recurso aos grandes escritórios de advogados (vou achar engraçado explicarem isto aos principais fornecedores de recursos humanos da Assembleia da República), concordo com o impulso à reabilitação dos centros urbanos em detrimento da construção de novas áreas (sempre altamente especulativa), concordo que o Estado deve ser mais transparente. Acima de tudo, concordo que o Estado deve ser modernizado, pois como sabemos tudo chega com um certo atraso a Portugal... Inclusivamente, em alguns casos, a inteligência. Mas isso é outra reforma...

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Pintices...

Por incrível que pareça, na actualidade ainda existem pessoas que acreditam que alguns nasceram para servir e outros para reinar. E quem pensa o contrário tem memória curta e falta de inteligência, "prontos", já disse!

quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Politicamente incorrecto


No início deste post deixo aqui uma declaração de intenções, para que não haja confusão: gosto de futebol e de ver um bom jogo; adoro animais, principalmente cães.
Portanto, não levem a mal quando digo que acho incrível que este país só se irrite quando se fala de jogadores da bola ou animais de companhia. É triste a escolha das prioridades manifestada. No entanto, se só por esta via se consegue chegar à sublevação das massas e ao protesto, pois que assim seja. Fica aqui o meu apelo a quem de direito: por favor continuem a denegrir a imagem do Cristiano; limitem a ocupação por apartamento a ½ animal de estimação. Pode ser que se use a sinergia criada por essa onda de indignação no protesto social realmente urgente.

PS - desculpem lá qualquer coisinha...

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Becos


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            Quando eu era miúdo vivia num Beco, onde um puto chamado Zé era o terror do Bairro. Fisicamente não era muito assustador, mas emanava uma aura intimidatória que nos formatava a vontade e nos deixava à sua mercê. O Zé andava sempre a tentar surripiar as guloseimas da malta. Incrivelmente conseguia fazê-lo de forma a sermos nós voluntariamente a cedê-las. Não raras vezes levava também a demasia do gelado acabado de comprar, convencendo-nos que, no fundo, não tínhamos qualquer finalidade para aquele dinheiro. O que era justo era que o mesmo reverte-se a favor de todos e que ele se encarregaria disso. Instalava a desconfiança dizendo que o Diogo tinha dito que o Francisco não dava nada a ninguém e que o Rui tinha tirado o dinheiro ao João e que o Álvaro lhe tinha dado a mesada para ele juntar ao seu pecúlio e investir numa bola de futebol nova para jogarmos, daquelas mesmo oficiais (a tal que nunca vimos), entre outros episódios ficcionados. Os putos, de forma natural, bufavam-se uns dos outros, ajudando a manutenção desta ordem.
           Zé era o mais esperto de todos e levava sempre a sua adiante. Conduzia-nos por um caminho que ele entendia ser o correcto, mas que nos deixava descontentes. Os anúncios de grandes feitos pecavam por excesso. A garotagem chegou ao seu limite e começou a conspirar pela mudança. Infelizmente ninguém se sentia em condições de guiar a revolta e as clivagens no grupo impediam as naturais alianças para o fazer. Apenas Paulinho, o mais inteligente lá do Bairro, parecia à vontade com esta situação. Mas para dizer a verdade, Paulinho estava sempre à vontade com tudo. Dava-se bem com Zé e seu séquito, mas também com os putos ostracizados. Conseguia ser o fiel da balança, mas sempre da pior forma. Dizia meias verdades para defender a sua posição de pretensa neutralidade. Tinha a mania que era a Suíça lá da Rua... Estranhamente esta situação era encarada de forma condescendente pelo pessoal.
          Foi então que apareceu Pedro, o chavalo novo lá do Bairro. Caído ali de paraquedas e com ar sério, que lhe aparentava uma idade e sabedoria superior à que efectivamente possuía, era o tipo ideal para encabeçar a sublevação. Mal começou a aparecer, percebeu-se logo que nascera para liderar. Tinha convicções fortes e inabaláveis. Mas começámos a reparar que, mesmo com tantas certezas, entrava invariavelmente em contradição consigo mesmo. Não ligámos muito, porque o que queríamos mesmo, mesmo, era livrarmo-nos do Zé... O Pedro aceitou a missão e escolheu Paulinho como seu aliado, pois entretanto este já se tinha posto a jeito e dado a entender que acataria bem ficar sob o seu protectorado. Paulinho, secretamente, sempre quis ser o Chefe do Bando, apenas nunca tinha tido coragem ou arte para lá chegar sozinho. O caminho de bufo a soldo que percorreu, não ajudava nessa conquista.
           Assim Pedro vingou! O Zé foi escorraçado e nunca mais se viu no Bairro. Dizem que emigrou, mas nunca tive certeza, pois estranhamente ainda sentia a sua presença. Pedro prometeu tirar a nossa Rua da amargura. Libertá-la dos rufiões das ruas estrangeiras que andavam por ali a agoirar. Iríamos voltar a ser uma Rua alegre e divertida, como em tempos idos. Só se esqueceu de avisar que para isso acontecer, teríamos todos de hipotecar o nosso presente e a nossa dignidade. Todos, à excepção do Pedro, do Paulo e de meia dúzia de outros putos que ajudavam a reinar o Bairro. Aqueles que, equivocadamente, colocámos no leme do nosso destino.
Passado pouco tempo, o troco dos gelados foi desaparecendo cada vez mais frequentemente, até chegar ao ponto de nem gelados comprarmos. As guloseimas passaram a ser um bem escasso, pois como não tínhamos produção própria, havia necessidade de importar das ruas vizinhas, o que aumentava o nosso défice comercial. Isso era inaceitável e o melhor era cortar o mal pela raiz. Como? Deixando de consumir...
           O prestígio de Pedro aumentava pelas ruas vizinhas, reflexo do definhamento do seu Bairro, vítima selecionada da austeridade imposta. Mas, lá fora, ninguém se preocupava muito com isso. Paulinho tentava internamente, através dos seus discursos acrobatas, disfarçar o óbvio. Torna-se impossível travar o mal-estar que se instala novamente na Rua. As inevitabilidades empurradas pelas nossas goelas abaixo, causavam indisposições frequentes. A indignação ia florescendo. Aqui e ali apareciam bolsas de protesto, que se extinguiam quase de imediato. Porém foram estas a génese da revolta. Os putos perceberam que da união poderia surgir a força para fazer ouvir a nossa voz, clamando por justiça, por um rumo diferente. A Rua que foi do Zé era um beco sem saída, mas na nossa marcha à ré deparámo-nos com nova parede, edificada pelo Pedro e pelo Paulo. Felizmente que tínhamos guardado as marretas, para derrubar os muros que nos asfixiavam... 

Dia 26 de Outubro sai à Rua e traz a tua indignação! Vamos libertar-nos dos Zés, dos Pedros e dos Paulos desta terra. Vamos derrubar a parede do beco sem saída em que querem encurralar a nação.

22 de Outubro de 2013 
Miguel Dias 

sexta-feira, 18 de outubro de 2013

Temos é que ser gente, pá!


Entrevista publicada originalmente no semanário Se7e, de 27.11.1985.

É quase assustadora a actualidade desta citação. Passadas quase três décadas, uma geração inteira, parece que foi proferida ontem. Infelizmente, isso não é nada bom. Quer dizer que em 30 anos pouco evoluímos. Esta entrevista do Zeca deveria estar datada e ultrapassada. Só a sua música deveria ser intemporal. O conformismo deveria ser um sentimento há muito enterrado, juntamente com os últimos fantasmas da ditadura. Deveríamos respirar liberdade e agitar o caldeirão social ocasionalmente. Mesmo em tempos de prosperidade deveria ser fomentada a discussão, porque há sempre algo a melhorar há sempre outro rumo pelo qual optar. Deveria muita coisa, mas nada sucedeu. E porquê? Porque o medo continua instalado na sociedade. Apenas sofreu uma mutação. O medo físico foi substituído pelo psicológico. Agora já não se foge da PIDE e dos seus bufos. Agora foge-se da precariedade e da miséria. Temos medo, e muito! Medo de perder o emprego, de não ter dinheiro para comer, de ficar sem acesso à saúde ou aos medicamentos, de não conseguir comprar os livros escolares aos nossos filhos e muito mais. Paradoxalmente temos ainda medo de não conseguir pagar a dívida, que não contraímos, e de não conseguir regressar aos mercados. O espectro do caos é-nos impingido diariamente, seja pelas elites instaladas seja pela subserviente comunicação social. E é com esta enorme espada de Dâmocles a pender sobre a cabeça da sociedade, que vivemos o nosso dia-a-dia. Desta forma, interiorizamos que mais vale não criar agitação, não fomentar o desassossego. Não vá o fio quebrar e a espada cair.
As lições da história recente do país foram rapidamente esquecidas. Facilmente apagadas com os milhões encaixados pela entrada na CEE. A fonte parecia não secar e deixámo-nos ao sabor de uma classe política esventrada de qualquer ideologia (seja de esquerda ou de direita), em que o roteiro seguido é o do caminho mais fácil para o cifrão. E aparentemente estamos conformados com este estado de coisas, pois continuamos a arranjar bodes expiatórios para fugir ao confronto. Porque chove ou está calor, porque são todos iguais, porque não há como escapar, porque a Greve é boa é para o patrão e porque as manifestações nunca dão em nada.
Mas todos concordamos que o caminho do sacrifício eterno dos mesmos, não pode ser solução. Algo tem de ser feito. Infelizmente não é possível fazer no conforto de nossa casa, olhando para o ecrã do computador. O mesmo pode e deve ser usado como uma arma para despertar consciências e divulgar informação, que de outra forma não chegaria à população em geral. Mas só descendo às ruas poderemos forjar no espaço público, perante todo o país, a justiça desta luta! Temos de dizer basta, mas também apresentar opções. A confrontação ideológica não é fácil, exige coragem, maturidade democrática, consciência política. Mas é preciso contrapor alternativas ao caminho da austeridade. E elas existem. Estão escondidas em PPP’s e nos off-shores, na Banca e nos Swaps. Ardilosamente disfarçadas em concursos públicos estranhos ou em derrapagens orçamentais incoerentes. Voltámos, portanto, a cair no mesmo logro, agora em versão 2.0.
Amanhã dia 19 de Outubro de 2013, o povo vai sair à Rua. A acção foi proposta pela CGTP, mas deve extravasar o contexto sindical, sob pena de ficar rotulada. Espero, por todos nós, que as manifestações no Porto e em Lisboa tenham uma “brutal” adesão. Homens e mulheres, novos e velhos, público e privado, empregados e desempregados, toda a população clamando por um outro caminho, possível e justo! Deixarmos de carregar esse estigma que nos reduz à condição de “mulherzinhas” e “homenzinhos”. Renovar e instaurar a arte do protesto na nossa sociedade, para que aquilo que passamos, jamais volte a suceder. E todos em conjunto lembrarmos que “temos é que ser gente, pá!”, exigindo, simplesmente, ser tratados como tal...

18 de Outubro de 2013
Miguel Dias

terça-feira, 15 de outubro de 2013

O FUTURO QUE NÃO QUEREMOS

O futuro que não queremos senta-se todos os dias dentro do nosso televisor, sempre muito reluzente e penteadinho. Veste bem e fala ainda melhor. Verbaliza, num discurso redondo, ameaças camufladas ao estado social. Tenta personificar a realidade de um país que não conhece e que provavelmente nunca visitou. Julga suficiente ir a meia dúzia de feiras e falar com alguns agricultores, para conhecer os reais anseios da população. Viola os nossos sentidos com um populismo sagaz, desenvolvendo mil e uma formas de dizer a mesma mentira. O ontem é sempre medonho, o hoje é claramente inevitável e o amanhã invariavelmente dourado.
O futuro que não queremos arremessa conceitos ocos como ajustamento, período excepcional, cisma grisalho, justiça social ou condição de recurso. Estranha conceitos menos nobres como pobreza, fome e precariedade. Ignora o princípio do igual acesso à Saúde, Educação e Justiça, o verdadeiro triunvirato que deveria reger os princípios de toda e qualquer sociedade moderna e democrática. Faz a apologia da integridade, mas arremessa medidas dantescas que abalam as relações de confiança entre cidadão e Estado.
O futuro que não queremos é o eterno defensor dos fracos e oprimidos. O protector dos idosos e o paladino das crianças. Os mesmos que foram empurrados para a indigência e que se vêem eternamente sentenciados a essa condição. Os que se viram reduzidos a uma refeição por dia, a habitações sociais decadentes e a um destino incerto mais que certo. A hedionda verdade de abrir uma torneira mas a água não verter ou ligar um interruptor e a luz não acender.
O futuro que não queremos delimita linhas vermelhas constantemente, sobre as quais se equilibra habilmente, esticando-as a jusante ou a montante conforme a necessidade. Adormece a nossa consciência colectiva e tenta injectar-nos uma falsa consciência social, com o objectivo de nos culpabilizar pelo estado actual a que o país chegou. A culpa do idoso sem abrigo, da criança com fome, do desempregado de longa duração é sempre nossa, que gastámos acima das nossas possibilidades e vivemos como paxás.
O futuro que não queremos aponta o dedo a atitudes alarmistas, geradas por fugas de informação autóctones e propositadas. Representa na perfeição o papel de bom samaritano, vilipendiando todos os que criticam a austeridade cega, apelidando-os de profetas da desgraça e inimigos da nação. Identifica o rumo seguido como o caminho da verdade e o único possível para acabar com o estado de protectorado em que vivemos, reconquistando assim a nossa soberania. Uma falsa noção de independência, baseada no nirvana do regresso aos mercados.
O futuro que não queremos há muito que deixou de chocar as nossas expectativas. Eles são subsídios que não eram para suspender, salários que não eram para baixar, impostos e taxas que não eram para subir, pensões e reformas que não eram para cortar, desemprego que não era para aumentar, património que não era para alienar.
O futuro que não queremos é lobo trasvestido de cordeiro. Branqueia os seus dentes, apenas para morder de forma mais graciosa...
Já todos sabemos o futuro que não queremos, resta saber o que pretendemos fazer relativamente a isso. 

14 de Outubro de 2013

Hipocrisia - Agora preto no branco

(Acerca da publicação do Decreto-Lei n.º 133/2013, de 3 de Outubro:)

Avizinha-se novo assalto aos funcionários públicos e empregados do sector público empresarial. A publicação do Decreto-Lei n.º 133/2013, de 3 de Outubro inicia essa contenda, “equiparando” (leia-se: nivelando por baixo) os valores de subsídio de refeição, ajudas de custo e outras remunerações dos trabalhadores do sector empresarial do Estado à tabela vigente para a função pública. De acordo com as notícias que têm vindo a lume ultimamente, o assalto continuará com as resoluções a sair do próximo Conselho de Ministros (quinta-feira dia 10 de Outubro de 2013), pois parece estar a ser cozinhado um novo corte de 5% nos salários da função pública, a juntar, claro está, ao que já se encontra em vigor. Persiste ainda a dúvida se esse corte será definitivo ou temporário. Mas isso não tem particular importância, dado que precisamente o corte que está actualmente em vigor e que deveria ser provisório irá passar a definitivo! Confusos? Acho que este tipo de jogadas já não surpreende ninguém. Num país onde o irrevogável depressa se torna revogável e onde as férias são impreterivelmente pela altura do natal, tudo é normal.

No entanto, o que me causou maior consternação no referido Decreto-Lei nem foi a questão do subsídio de alimentação (Artigo 18.º) ou da dissertação acerca das qualidades necessárias para preencher o lugar de Gestor Público (Artigo 21.º - de gritos quando confrontamos com a realidade). Foi antes o Artigo 50.º, que versa sobre a política de recursos humanos e onde se pode ler no n.º 1 “As empresas públicas implementam políticas de recursos humanos orientadas para a valorização do indivíduo, para o fortalecimento da motivação e para o estímulo do aumento da produtividade, tratando com respeito e integridade os seus trabalhadores e contribuindo ativamente para a sua valorização”, que prendeu toda a minha atenção. Escuso-me a fazer qualquer tipo de comentário sobre esta citação. É a hipocrisia devidamente legislada, preto no branco, disponível num Diário da República perto de si!

Ao ler estas linhas nasceu em mim uma vontade de rir irreprimível. Não aquele riso cómico, mas antes um riso de escárnio, na tentativa de arrancar com pé-de-cabra o asco que se grudou ao fundo do meu ser. É difícil e quase impossível combater o estado de inquietação constante que me assola, arrastando-me para o negro cenário da inevitabilidade, da inútil resistência. Mas desistir não é opção, não tenho essa escolha. Por mim, por nós, mas acima de tudo pelo meu filho e por toda a sua geração...

Muitos se irão juntar ao aplauso destas medidas, acenando com a bandeira do fim dos “privilégios”, alinhando assim com um discurso que tenta voltar o povo contra o povo, o público contra o privado, o sobrevivente contra o remediado. Nem sequer paramos um pouco para pensar que todos perdemos, desde há pelo menos 3 anos para cá... E enquanto nos envolvemos em pequenas quezílias e questiúnculas, que em nada nos irão favorecer, o rolo compressor da austeridade continuará a nivelar uma sociedade portuguesa cada vez mais empobrecida e envelhecida...

8 de Outubro de 2013
Miguel Dias

Do absoluto ao relativo

(Sobre o resultado das Eleições Autárquicas, no Concelho do Montijo, escrevi assim:)

O país foi a votos, em todos os concelhos e em todas as freguesias. O Montijo não foi excepção... No dia 29 de Setembro de 2013 escolhemos quem iria governar o Município pelos próximos quatro anos, embora só tivéssemos conhecimento oficial dos resultados no dia seguinte, já a manhã se tornava tarde.
A meu ver foi dado um claro sinal pela população, que não iria mais pactuar com a política de arrogância praticada pelo executivo PS. A mesma política que arrastou todo o território para um abandono generalizado. Por isso foi retirada a maioria absoluta a que a anterior administração camarária estava tão habituada. 
Pela mesma ordem de razão, o voto não passou para o lado da bipolaridade política, isto é do PSD, pois o povo discerniu atempadamente que a senhora que se apresentava para conduzir os destinos do concelho e que prometia um desenvolvimento estonteante e um apoio social sem precedentes, é a mesma que se senta na bancada parlamentar desse partido e que suporta o actual Governo nacional, votando dia após dia as medidas que empobrecem este país e castigam o poder local. Por muito que apontem, quase em desespero de causa, a diferença entre eleições locais e legislativas, todos nós sabemos a agenda que marca a ideologia de direita presentemente no país, como inclusivamente inúmeros simpatizantes dessa facção criticam publicamente. As pessoas sentem na pele as acções do poder central, que se repercutem também nas Autarquias, pois estas não são células estanques.
Por isso o povo optou pela mudança. É certo que o executivo continua nas mãos do mesmo partido político, mas agora com menos 4.000 votos (passaram de 8.952 votos em 2009, para 4.726 nestas eleições) e menos um vereador, o que se traduz num equilíbrio de forças na Câmara Municipal, com 3 vereadores para o PS, 2 para a CDU e 2 para o PSD. O absoluto tornou-se agora relativo. Com esta nova realidade, as medidas camarárias terão de ser realmente discutidas e negociadas. Deverão ser encontrados consensos, o que em última análise favorecerá o povo montijense. Acredito que é possível governar para todo o Concelho e não somente para alguns. Basta para isso que o PS desça do seu altar absoluto e discuta as suas opções, devendo também ouvir, ao invés de pura e simplesmente ditar. É urgente arrepiar caminho e começar a pensar Montijo!
Logicamente que, para quem votou na verdadeira mudança, como é o meu caso, não se poderá esconder um certo amargo de boca pelo resultado do escrutínio. Efectivamente, um novo paradigma esteve apenas a 426 votos de distância. Mas quem diria, quando a campanha começou, que a CDU passaria a segunda força mais votada e que poderia estar tão perto de libertar o Montijo. E só não se concretizou graças ao populismo que continua a grassar no panorama político e que encontra terreno fértil em meios pequenos como o nosso. Meios onde o medo facilmente se instala nas comunidades.
Não posso deixar de reflectir sobre os números da abstenção no Concelho – 60%... Não se iludam! Nada é garantido! E temos exemplos diários do assalto a direitos que dávamos como adquiridos. As conquistas de ontem são os cortes nas “gorduras” de hoje e os ajustamentos inevitáveis de amanhã. É uma grande responsabilidade viver em Democracia. E essa responsabilidade deve e tem de ser compartilhada por todos. Mais de que um direito, o voto é um dever. Todos devemos escolher. Mas mesmo que hajam grandes dúvidas, optar pela mudança não é necessariamente optar pelo incerto! A abstenção não é um castigo aos políticos nem aos seus partidos. É antes um golpe desferido ao coração da Democracia. A abstenção apenas beneficia os grandes, cujos votos estão sempre garantidos por uma massa acrítica, que mais não deseja do que uma oportunidade de se servir do sistema estabelecido. Se a maioria inerte, que clama pela renovação política à mesa do Café, levanta-se bem alto o seu voto e elege-se as reais alternativas, constantemente minimizadas pelos interesses instituídos, podem ter a certeza que isto mudava...

7 de Outubro de 2013

Miguel Dias

O Reino do Montijo

(Na altura das Eleições Autárquicas, no Concelho do Montijo, escrevi assim:)

No Reino do Montijo existe uma edilidade que em 3 anos e 48 semanas nada fez em prol do Município.
No Reino do Montijo assiste-se nas últimas 3 semanas a uma multiplicação de acções camarárias, num autêntico frenesim orgíaco pré-eleitoral.
Eles são votos de louvor a cidadãos montijenses que há muito o mereciam, declarações de património imaterial do município de festas populares, cedências de terrenos para sedes de motoclubes, jardins com relva cortada e regados (com água e tudo), reduções de IMI (em 0,05% - impressionante!), estradas remendadas, limpeza da via pública e tudo acompanhado com a tradicional pompa e circunstância a que já nos habituou esta governação PS. Não está em causa a justeza da maioria destas medidas, apenas a sua calendarização.
Tudo isto se passa pela mão da Rainha Maria Amélia Antunes, que em governações sucessivas (o PS está no poder camarário vai para 16 anos) apenas conseguiu que este concelho definha-se, perdendo a sua influência na região e a sua própria identidade. Sob o signo de uma nova ponte sobre o Rio Tejo, que obrigatoriamente criaria uma evolução natural do concelho, o desenvolvimento sustentável foi sacrificado por um novo paradigma de urbanização desenfreada, que mais não fez que criar bairros fantasmas, facilitando e incrementando o abandono e degradação do Centro Histórico da Cidade.
Através de uma rápida visita aos concelhos limítrofes do Montijo, podemos ver a distância que nos separa dos mesmos, naturalmente pela incúria do executivo camarário. Dizer que não há dinheiro não chega! Nem tampouco será verdade insofismável, dado que os licenciamentos e impostos camarários que jorram desde abertura da Ponte Vasco da Gama, bem aplicados, dariam com certeza para mais e melhor Montijo...
Mas o povo é soberano e o Montijo, apesar da abstenção ultrapassar os 50%, tem dado sistemáticos votos de confiança a Maria Amélia Antunes, cegados certamente por uma propaganda barata e vergonhosa e por obras pré-eleitorais que subvertem os princípios democráticos. As pessoas só se lembram do imediato e não têm vontade de buscar no baú da memória a degradação a que esta Presidente de Câmara devotou o concelho.
No Reino do Montijo umas quantas classes nobres são favorecidas, enquanto a plebe, o comum dos cidadãos, se vê cada vez com menos. O concelho tem agora, sem dúvida, mais asfalto e mais betão... Mas tem também cada vez menos saúde, transportes e educação. Os casos são sobejamente conhecidos e falam por si. É a auto-intitulada capital da flor, com palmeiras a morrer...
Neste reinado que já vai longo, a Monarca Montijense Maria Amélia Antunes na última reunião pública deste executivo camarário, realizada na passada quarta-feira dia 18 de Setembro, afirmou do alto da sua arrogância política, que “...escusa de vir com a provocação das eleições, porque eu vou ser eleita para a Assembleia Municipal. Só não serei eleita se morrer”, em resposta às acusações de aproveitamento eleitoral evidente, verbalizadas pelo Vereador da CDU Joaquim Batalha (Diário da Região, edição de 20 de Setembro de 2013). Que bom seria que todos os munícipes dessem uma lição de humildade a esta senhora e no próximo dia 29 de Setembro a fizessem engolir as suas palavras...

23 de Setembro de 2013 

Miguel Videira Cardoso Dias
Habitante no concelho do Montijo


Porque eu quero uma voz que nos defenda

(Acerca da eleição da Comissão de Trabalhadores da empresa onde trabalho, escrevi assim:)
Estamos na semana anterior à eleição da nova Comissão de Trabalhadores (...), que defenderá os nossos direitos durante o período de 2013 a 2017. Pelo menos é assim que eu gosto de pensar, e é assim que eu tenho de pensar, para ainda conservar uma réstia de esperança. Não nos enganemos, esta será com certeza a Comissão de Trabalhadores com tarefa mais espinhosa que alguma vez elegemos e à qual mais exigiremos. Para tal exigência ser devidamente fundamentada teremos forçosamente de votar massivamente no próximo dia 29 de Maio, independentemente da lista escolhida. Só com uma gigantesca percentagem de votantes pode a Comissão eleita partir para uma guerra, que se espera sem quartel, frente à Administração (...), pelejando pela defesa intransigente dos direitos de todos os trabalhadores. O peso que a Comissão terá, está intrinsecamente ligado ao número de votos contabilizados.
Este órgão encerra em si mesmo as mais diversas facções, credos, tendências e anseios dos colaboradores do Grupo (...). É heterogénea no seu âmago, mas terá de exibir homogeneidade na mesa de negociações. A minha exigência, a nossa exigência, terá de ser pela defesa a uma só voz das condições laborais. Temos deveres que diariamente cumprimos, e que deveremos continuar a fazê-lo, mas temos também direitos arduamente conquistados, que não podem ser usurpados sempre que o país enfrenta dificuldades.
Vivemos tempos perigosos. Os poderes instituídos tentam embutir a ideia de que não há alternativa senão cortar. A Administração (...) acena afirmativamente com a cabeça e aplica sem querela a cartilha da austeridade sobe uma instituição secular, que já presenciou muitas crises e se mantém de pé. (...) pertence a todos os colaboradores, mas acima de tudo pertence a Portugal. A defesa dos seus trabalhadores é a defesa do interesse nacional. Muitos olhos gulosos observam avidamente este grandioso grupo económico em fase de desmantelamento, até ao momento em que finalmente (...) seja privatizado em regime “low cost”. A nós, cabe o penoso bater de pé. A oportunidade de dizer não, através da acção dos elementos eleitos para a Comissão de Trabalhadores.
Este será, provavelmente, o primeiro ano do resto das nossas vidas. Desengane-se quem entrou para a Caixa há 20 ou 30 anos e que conta tranquilamente o tempo para uma merecida aposentação. Os direitos deixaram de ser adquiridos. Já não podemos passar por esta instituição incólumes politicamente. Temos de ser activos. Mandatar 11 elementos para serem a expressão da nossa vontade perante a Administração (...), mais que um direito, é um dever de todos os trabalhadores. Numa época em que nada é garantido, apenas através da constituição de uma Estrutura de trabalhadores forte podemos defender o que ainda não foi esbulhado e tentar reconquistar o que nos foi surripiado. Não basta criticarmos tudo e todos por detrás das nossas secretárias e depois cruzarmos os braços, esgrimindo chavões como “eles fazem todos o mesmo” ou “eles querem é tacho”. Urge responsabilizar as pessoas que elegemos para defender o que nos é devido. Para isso suceder, teremos que nos envolver em todo o processo desde a eleição à composição da Comissão de Trabalhadores, das suas reuniões aos seus comunicados. Nunca esquecendo porém que exigir é também apoiar!
Não embarco em ilusões, mas também penso que a inércia nunca foi, nem será, solução. Votem em A, B, C, D ou E, mas votem. Não se demitam das vossas responsabilidades. Se não o fizerem por vocês, façam-no pelos vossos colegas.

24 de Maio de 2013