terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Com os desejos de um 2015 menos austero

2014 – Sob o signo da austeridade

O ano horribilis de 2014, que agora chega ao fim, foi o ano em que a palavra austeridade deixou de ser encarada como uma novidade e entrou definitivamente no léxico do povo português. Mas essa não vem só… Vem acompanhada de rendas e adornos e toda uma novilíngua que nos força a ideia já gasta de que não há dinheiro e que por isso foi (e é) preciso cortar, perdão – “reformar”.
O recente enaltecimento do esforço da população portuguesa por parte das principais figuras governativas é hipócrita e soa a uma falsidade pré-eleitoral que dá asco. O esforço imposto aos cidadãos, e que nunca foi pretendido por estes, não foi justo nem uniforme, como tanto apelidam. Quem pagou, e continua a pagar, esta fatura foram os mais desfavorecidos e a classe média. Não se pode de forma alguma defender que alguém com o salário mínimo, alguém que se equilibra numa precariedade constante ou que esteja desempregado, contribua da mesma forma para o esforço nacional de regularização de uma dívida, que em boa verdade até deveria ser reestruturada. Mas essa é outra história.
Os “Gatos Gordos” da economia portuguesa, que engrossam milhões aos seus lucros apesar da crise, não são convocados a colaborar com qualquer esforço adicional para fazer face a esta situação de emergência nacional. O tal dever patriótico que tanto apregoam. Antes pelo contrário, até beneficiaram de alguns alívios como a descida do IRC e da TSU no caso dos funcionários que recebam o ordenado mínimo. E mais contrapartidas virão certamente, se a suspensão transitória da redução do pagamento das horas extraordinárias realmente acabar no final do ano tal como está estipulado. Nunca fiando, pois esta já sofreu um adiamento…
No fundo, isto é a tradução perfeita da expressão sabiamente utilizada por uma figura proeminente do maior partido da direita nacional – Luís Montenegro, que afirma: “a vida das pessoas não está melhor, mas o país está muito melhor”. Aquele tal país em que não habitam pessoas verdadeiras, apenas estatísticas e grandes corporativas. Aquele país que está a ser vendido a retalho. Esse está muito melhor! Mas nesse país eu não vivo, nem a maioria dos portugueses…
Da infeliz, embora sentida, expressão deixada para a posteridade poderíamos tecer uma série de episódios no presente ano que tão bem a ilustram. As dificuldades no Serviço Nacional de Saúde e no tratamento dos doentes crónicos, as dificuldades no ensino obrigatório e a decadente novela de colocação de professores, as dificuldades na justiça e um novo mapa judiciário que dificulta o acesso das populações aos tribunais. Estes são apenas alguns exemplos do que se passa no país real, o tal que está muito melhor. Que não foram escolhidos ao acaso. Tratam-se de setores basilares para uma democracia moderna e defendidos pela nossa Constituição.
Quando por vezes me perguntam qual a grande diferença entre a Esquerda e a Direita recorro ao tipo de resposta dada por cada lado da barricada perante os dramas sociais. A reposta perante os doentes, os desempregados e os mais necessitados. Nesses casos a Esquerda tem sempre uma visão muito mais social. Cria medidas concretas para tentar solucionar os problemas. A Direita ou vai a reboque destas medidas, embora retalhando-as aqui e ali, ou diz que o que é realmente preciso é menos Estado e mais iniciativa privada, criticando a apelidada subsídio-dependência, que no fundo não é mais que a tentativa de atenuar as desigualdades através do papel redistributivo que o Estado Social deve ter.
Com efeito, a vida das pessoas não está melhor. Está cada vez mais difícil… E não posso deixar de concluir que é mesmo esse o objetivo. A construção de uma sociedade com baixa qualificação, fracas expectativas e disposta a aceitar tudo o que lhes for imposto, sem qualquer contestação, sem qualquer sobressalto. É a implantação da Austeridade como dogma político, que vem acompanhada de um Tratado Orçamental que estrangula as economias pequenas e que tornará impossível quebrar o círculo recessivo e impor a agenda progressista que Portugal necessita.
Despeço-me com o habitual desejo de um próspero ano de 2015 para todos, mas infelizmente suspeito que tal não será possível. Talvez seja mais realista desejar apenas um ano menos austero…

Montijo, 28 de Dezembro de 2014
Miguel Dias
Membro da Assembleia do LIVRE e do Núcleo Territorial de Setúbal
Promotor da Convocatória Tempo de Avançar

http://www.distritonline.pt/opiniao2014-sob-o-signo-da-austeridade/

terça-feira, 25 de novembro de 2014

Conformismo | Subserviência | Medo

Conformismo

 Subserviência                   Medo


Ao tirar-se um instantâneo da sociedade portuguesa fica sempre a noção de que o conformismo é um dos 3 vergonhosos pilares que a sustenta. Os outros são a subserviência e o medo, os quais, obviamente, andam todos de mão dada.
Numa época em que nos acenam com o papão dos mercados, com a certeza da incerteza, com a precariedade instituída, mais vale, se calhar, contentar-nos com o pouco que nos resta. Fazer como o passarinho que saltita pelo asfalto em busca daquela migalha perdida e depois esvoaça para o ramo mais próximo, para cantar vitorioso mais um dia de alegre sobrevivência. Sim, sim… Mais vale ser como o passarinho, porque raposas já há por aí muitas e nós não temos matreirice suficiente para chegar a esse nível.
Ora, a secular teoria de que mais vale estarmos contentes com o que temos e não levantar muitas ondas é quase tão antiga como o próprio país e tem raízes numa religião que sempre incitou este tipo de comportamento, para na retaguarda ostentar a riqueza arrecadada pela perpetuação da miséria. Numa visão mais recente, sabemos que os 48 anos da longa noite apenas aprofundaram estes tipos de sentimentos nos portugueses. Nessa época, a cultura de subserviência foi aprimorada elegendo-se uma certa casta a que todos prestavam vassalagem e era um sem fim de Senhor Doutor para aqui e de Sua Excelência para lá. Incrivelmente, essa cultura persiste nos tempos que correm e é até adoptada por gerações mais novas, gerações nascidas da Liberdade, mas que se calhar nunca foram educadas sem grilhetas.
Durante a longa noite foi também tomando conta o medo. O medo do não haver para comer, o medo da constante perseguição, o medo dos ouvidos nas paredes e o medo de em cada amigo ter um bufo. Esta rede montada em regimes autoritários deixa semente e ainda hoje se vê que é desporto nacional a maledicência, a inveja, a cobiça...
E o medo continua à espreita em cada esquina. Porque podemos perder o emprego ou sofrer novo corte na reforma. Pode acabar-se o subsídio de desemprego ou terminarem com o Serviço Nacional de Saúde. O ensino universal e gratuito pode cessar e sei lá mais que monte de situações podem ser suscitadas pela sublevação das massas.
São estes medos que nos fazem subservientes e conformados com o estado de coisas. São estes os traumas que assombram o subconsciente nacional…
Recentemente, alguém me perguntava se eu tinha consciência que a organização para a qual trabalho era controlada pelo poder político; se era ingénuo a esse ponto... Respondi que apenas era ingénuo até ao ponto de ter plena confiança no meu profissionalismo e trabalho desenvolvido, e que não iria ceder a qualquer tipo de pressão que tentasse incutir-me o medo ou colocar-me numa posição subserviente perante quem quer que fosse. Resposta naïf, evidentemente. Mas a verdade é que esta conversa já decorreu há algum tempo... Ainda não me aconteceu nada; pelo que deduzo que, provavelmente, essa pessoa foi bater a outra porta, que de certeza se abrirá de par em par.
O chorrilho de represálias é infinito. Nós pensamos, refletimos, pensamos um pouco mais e chegamos à conclusão que se calhar mais vale ficarmos quietinhos. Bem ou mal, estes 40 anos de Democracia sempre nos trouxeram alguns “privilégios” (leia-se direitos). Será certamente mais seguro manter as conquistas obtidas, do que lutar pela possibilidade de acrescentar novos direitos. Esta forma de conformismo, que o é efetivamente, deve ser combatida, quer pela resistência interior, quer pela união de todos face ao flagelo da falsa noção de Liberdade, que nos enfardam dia após dia, por todos os sentidos adentro. Com a nossa resiliência poderemos conquistar novas bandeiras, ao invés de permanecer sofregamente agarrados às mesmas.
A verdade é que responsabilizamos as entidades competentes muito abaixo das nossas possibilidades. Reclamamos muito, mas invariavelmente mal. Esperamos sempre que um qualquer messias de dotes sebastiânicos nos retire do bueiro, para onde ele mesmo, numa outra vida, nos atirou. Mas, secretamente, sabemos que tal não vai acontecer... E continuamos presos na nossa revolta. Não saímos à Rua, nem exigimos responsabilidades. Indignamo-nos com o árbitro que “roubou” o penalti à Seleção, ao mesmo tempo que elegemos o autarca que “desviou” fundos do erário público, mas que até vai fazendo obra.
E se o país fechar? O último que apague a luz? Para onde iremos, cidadãos deste Portugal, tolhidos pelo medo, pela subserviência e pelo conformismo? Aí já não haverá tempo para alternativas. Já não haverá tempo para lutar. A austeridade não deixará pedra sobre pedra, do edifício do Estado Social. Aí será tarde demais. O Tempo é AGORA! E é Tempo de Avançar!!!

Montijo, 24 de Novembro de 2014
Miguel Dias
Membro da Assembleia do LIVRE
Subscritor da Convocatória da Convenção para uma Candidatura Cidadã
(www.tempodeavancar.net)

http://diariododistrito.pt/index.php?mact=News,cntnt01,detail,0&cntnt01articleid=2803&cntnt01pagelimit=10&cntnt01returnid=91

segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Quando a Esquerda é esclarecida

Quando a Esquerda é esclarecida consegue discernir o que realmente interessa – o consenso em torno dos interesses da população. O diálogo e o compromisso são as armas do progresso. As pessoas certas sentadas a uma mesa redonda, com uma caneta e um papel à frente podem fazer acontecer impossíveis. Nessa mesma lógica, as pessoas erradas podem soltar infernos. Isso fará toda a diferença aquando das próximas legislativas.
As esquerdas têm de compreender, de uma vez por todas, que o interesse geral do povo é mais importante do que qualquer agenda de tacticismo político ou qualquer tipo de sectarismo. Dito de outra forma: as esquerdas têm de entender, que têm de se entender! O preço a pagar por esta falta de compromisso poderá ser demasiado caro, fazendo com que a maioria dos eleitores não o consigam suportar.
Os resultados são evidentes: uma possível nova maioria de direita, com mais quatro tenebrosos anos de austeridade, que já provou o seu fracasso na saída da crise; ou uma hipotética reedição de um Bloco Central, institucionalizando o bipartidarismo, que muito provavelmente teria uma maioria de 2/3, necessária para alterar a Constituição da República Portuguesa – a tal que tem sido a garantia de que esta espécie de massacre nacional não tenha ido mais além.
As esquerdas têm de entender que o falhanço do compromisso e do diálogo não será tolerado pelo eleitorado, que há tempo demais aguarda por uma solução de Esquerda para o Governo nacional. Se a isto somarmos a hipótese da mesma ser ampla e plural, isso trará possibilidades infindáveis. Far-se-á sempre história, mas poder-se-á cunhar na sociedade algumas das bandeiras e ideias de Esquerda sonhadas em Abril, estando muitas em risco, outras longe de ter sido postas em prática. Falo da defesa do Serviço Nacional de Saúde, do Ensino Universal e gratuito, do direito à habitação, do direito ao trabalho digno e com direitos, do combate às desigualdades…
Caso a Esquerda ganhe as próximas eleições com uma maioria de 2/3, pode até por iniciativa própria fazer uma revisão constitucional que proteja ainda mais as pessoas, desta cada vez mais sinistra rede de interesses, que parece querer apostar num modelo de corporativismo, ao invés de um modelo solidário e cooperativo.

Quando a Esquerda é esclarecida une-se para eleger Presidentes da República ou para conquistar importantes Câmaras Municipais às mãos da Direita. Porque não fazer o mesmo para uma solução de Governação do país? Este é o ensejo próprio para se fazer história. Para construir uma real alternativa de governação de Esquerda. Todas as esquerdas estão convocadas para tal desígnio. Não temos o direito de defraudar o desejo da maioria do povo português. Queira desta vez a Esquerda ser verdadeiramente esclarecida.

Montijo
10 de Novembro de 2014
Miguel Dias

segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Roubos de Dignidade

Não sei se tenho urgência, se tenho decência ou nenhuma das duas. O que sei é que não posso mais assistir impávido e sereno, enquanto esta corja afunda fundo no meu bolso e leva o resto da minha dignidade. Há tempo demais que me andam a explicar que vivo muito acima das minhas possibilidades. Por isso mesmo diminuíram o meu salário, aumentaram os impostos e cortaram as prestações sociais. E eu “ajustei”. Nem tanto à grande e à francesa; mais à bruta e à alemã! E é incrível como isto tem facilitado o cumprimento escrupuloso dos meus compromissos nos últimos anos.
Estou certo que com a maioria de nós aconteceu o mesmo. Poderá ser este o tal milagre económico que algumas vozes alvitram? Ou se calhar somos todos personagens daquela famosa série “A vida das pessoas não está melhor, mas a do país está muito melhor!”
De indicadores que nada indicam estamos todos fartos. Foram discursos vazios e promessas vãs que nos conduziram ao actual labirinto. Um labirinto onde seguimos o ténue cheiro a queijo, fazendo o caminho que nos está a ser traçado pelos interesses instituídos e pelos mais ricos da “estranhamente solidária” União Europeia.
Mas há alternativa! Há sempre alternativa. Forçar as paredes do labirinto e encarar a liberdade. Este esforço tem de ser conjunto, pois não é fácil encarar a liberdade. Não é simples descobrir que temos escolha. Que a ideia que nos vendem do fatídico caminho único e austero pode ser sempre contraposta pela ideia do caminho mais solidário. O caminho onde os mais fortes ajudam os mais fracos; em que lhe lançam a mão amiga ao invés de uma bota cardada…
Este terá de ser o caminho que levará os PIGS a saírem da pocilga da crise e da austeridade em que se vêm atolados. O tempo em que estes concertam uma estratégia comum, para um rumo alternativo da União. A hora em que se contrapõe o crescimento sustentável ao desmesurado; o momento em que finalmente se compreende que a defesa de todos os europeus, da sua dignidade, é mais importante do que os lucros de 3 ou 4 multinacionais.
Não sei se tenho urgência, se tenho decência ou nenhuma das duas. Sei que o tempo de começar a fazer alguma coisa já passou. Sei também que nos iniciámos com ele e que temos feito o nosso percurso incansavelmente. Também sei que somos poucos e precisamos que muitos mais se juntem a nós; todos os que partilham da ideia que é necessária uma onda de fundo progressista para abalar os alicerces destas políticas suicidárias. Pelos vistos até sei algumas coisas… Mas tenho plena consciência de que é muito mais o que desconheço. Por isso preciso, precisamos, desta União. Deste grupo que nos permite elaborar uma alternativa credível baseada na salvaguarda de cada indivíduo, almejando uma Europa mais solidária, um crescimento ambientalmente responsável e um entendimento bem claro que ser de Esquerda é amar a liberdade e defender a humanidade; e entender que a necessidade de circunstância, nunca poderá comprometer a substância. Para que cessem, de uma vez por todas, os roubos de dignidade…

Montijo, pela manhã do dia 25 de Outubro de 2014 

sábado, 11 de outubro de 2014

MCM | Movimento Cívico Montijo - O Manifesto / 1.ª Iniciativa





Amanhã, dia 12 de Outubro pelas 15 horas terá lugar a 1.ª acção do MCM. Será uma caminhada pela cidade do Montijo com o intuito de sinalizar pontos para futura intervenção cidadã. O local de encontro será o Coreto da Praça da República. Queira o tempo ajudar. Identificar prioridades e em conjunto pesar Montijo.
MCM - juntos por mais e melhor Montijo!


MANIFESTO
O Movimento Cívico Montijo (MCM) surge da reunião de um grupo de cidadãos que têm em comum um espaço geográfico, que é simultaneamente uma paixão e um motivo de preocupação – o Montijo.
O objectivo do MCM é contribuir para a melhoria do território, através de acções simples e executáveis sem qualquer encargo financeiro para os participantes. Apenas é solicitado algum do tempo livre de cada um e o empenho necessário à prossecução das tarefas.
O MCM pautará a sua conduta pela realização de iniciativas que visarão uma melhoria efectiva na qualidade de vida da população do Montijo.
Todas as acções levadas a cabo pelo MCM serão divulgadas publicamente; de forma atempada e programada. Assim sendo, estaremos sempre de portas abertas à participação dos populares que desejem fazer parte das mesmas, pois apenas com a participação activa da população de Montijo, este Movimento poderá ser uma realidade.
Em suma, o MCM conta com todos os montijenses que pretendem fazer da antiga Aldeia Galega do Ribatejo um espaço melhor para viver e trabalhar. O facto de residirmos numa terra com 500 anos de história, não implica vivermos na Idade Média.
O percurso que agora se inicia será sinuoso e contará com alguns obstáculos levantados pela habitual inércia do nada fazer. Mas estamos certos que ainda restam muitas pessoas que conhecem o potencial que o Montijo encerra e que pretendem tirar o melhor partido do mesmo, para si e para as gerações vindouras.
Para memória futura, o MCM manterá um registo audiovisual de todas as iniciativas que promover, que posteriormente será difundido pelos canais mais apropriados para o efeito, evitando desta forma que o tempo apague o esforço de todos os montijenses que abraçarem esta causa.
Juntos por mais e melhor Montijo. É tempo de dar as mãos e lutar pela nossa Terra.
Montijo | Setembro de 2014
Os Promotores:
João Carlos Peres | Luís Bordeira | Miguel Dias

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Meu filho perdeu um professor...

Ainda não havia começado o ano lectivo e o meu filho já tinha perdido um professor. Cedo se percebeu que afinal tinha perdido dois… Nada de grave, segundo a tutela. «Um erro apenas. Pedimos desculpa e asseguramos que a normalidade será retomada dentro de momentos.»
Formalizado o ridículo lamento e elaborada nova listagem de docentes, meu filho descobriu que afinal agora tinha perdido três professores! Gentes de Coimbra ou de Vila Real, que após terem andando com a “casa às costas”, num autêntico contra-relógio logístico para estarem devidamente instalados para o início do ano lectivo, vêm vedado o direito ao trabalho e aberta a porta da incerteza. Pessoas e vidas concretas que se viram forçadas a optarem entre a sua residência ou a sua vocação para leccionar. A isto o iluminado Secretário de Estado da Educação Casanova responde que compreende a situação, mas afirma que legalmente não existe nenhum mecanismo que possa defender estes professores e compensá-los de todos os imponderáveis. Diz que há sempre a via judicial… Como se alguém a quem acabam de abrir a porta do desemprego ou perpetuada a indigência precária pensa-se em recorrer ao Tribunal.
Meu filho perdeu um professor, não dois, perdão três. E parece que é um sortudo. Ao invés, turmas existem no seu agrupamento que têm colocados apenas três professores. Alguns agrupamentos voltaram a fechar e outros ainda nem abriram. Mas o que nos ensinam estas intermitências? Que a precariedade veio para ficar. Que a aposta em descredibilizar a escola pública é bem real. Que as nossas crianças e jovens não votam, logo não contam. Que os pais sempre se remedeiam ou não fosse o “desenrascanço” uma “virtude” nacional. Que a educação é um privilégio.
Desenganem-se aqueles que pensam que o problema está apenas no corpo docente. O pessoal auxiliar é cada vez menos e multiplica-se em esforços para satisfazer todas as solicitações. Esta é outra pecha no sistema educativo. Primeiro veio a desregulação do pessoal não docente e a sua precarização, depois o “ajustamento” dos quadros, agora o desprezo total. Como se uma escola para funcionar condignamente, com um corpo docente empenhado em ensinar os nossos filhos, fosse uma espécie de teatro divino espectralmente ensaiado, uma obra do acaso.
Tudo isto é orquestrado por um sinistro Ministro da Educação que em tempos falava com ódio dos burgueses e agora aposta no «aburguesamento» da escola pública. A pretensão que as escolas funcionem como empresas ou o cheque-ensino são exemplos disso mesmo. Ideias que até mereceram honras de «guião» por parte do Vice-Primeiro-Ministro. Crato diz apostar num modelo de disciplina e rigor para a escola pública, que não consegue implantar no seu próprio Ministério. Patético…
Meu filho perdeu um professor, não dois, perdão três. Um acho que foi avistado no Algarve, outro nas Berlengas a ensinar matemática num santuário de aves marinhas. O terceiro está em parte incerta. As Direcções dos agrupamentos não sabem o que fazer, obrigadas que estão a assinar de cruz estranhos despachos que as oficializam como responsáveis de situações que não criaram. Ouvem os berros dos pais, o desespero dos professores e vêm frustrados os seus esforços para ensinar e orientar os nossos filhos, tornando-os pessoas apetrechadas das ferramentas necessárias para «ler e calcular» o Mundo. Essa que deveria ser a tarefa mais nobre da escola perde-se no empecilho burocrático, no erro, na incompetência ministerial.
Evidentemente, que os erros no sistema educativo não são de agora. Começaram antes deste Governo e continuaram após o mesmo. Mas o caminho que estava a ser trilhado até há meia dúzia de anos da progressiva melhoria qualitativa da escola pública está agora a desaparecer debaixo dos nossos pés. Esse caminho estava a ser construído em conjunto com os trabalhadores docentes e não docentes que em troca viram “descategorizadas” as suas funções e aumentada a sua precariedade. Chegando-se ao cúmulo de existir agora um tratamento desigual entre professores, sendo uns qualificados tacitamente e outros propostos a exame.
Meu filho perdeu um professor, não dois, perdão três. Possivelmente pela manhã quando chegar à escola descobrirá que perdeu mais alguns. E eu dissertarei sobre que país é este, que quer ser desenvolvido e moderno e que não cuida da educação dos seus mais novos. Que não cuida do seu próprio futuro. Que não defende a educação e muito concretamente a escola pública, universal e gratuita, como pilar essencial do progresso e desenvolvimento que se alvitra.
Meu filho perdeu um professor, não dois, perdão três. Mas descobriu que seu futuro está na charcutaria, pelo seu vil contributo na alimentaçãoda «salsicha da educação», segundo definição do eloquente Primeiro-Ministro. Meu filho é presentemente um enlatado! Só espero que o futuro não o transforme em entalado…
Montijo, 7 de outubro de 2014

sábado, 27 de setembro de 2014

Qual o Preço das Nossas Vidas?

Passaram pouco mais de 3 anos do dia em que descobrimos que o país estava para fechar. Com base nessa ideia, Portugal entrou em fase de liquidação. No fundo vendia-se um país inteiro, com pessoas a sério lá dentro, a preço de saldo. Para evitar esse destino foi negociado um empréstimo extremamente lesivo para os interesses nacionais, com uma troika cuja legalidade é altamente suspeita.
Depressa percebemos que era tudo bem baratinho. Bastava baixar os nosso ordenados, devolver a precariedade às nossas mulheres, os nossos filhos não ter professores e os nossos pais verem cortadas as reformas... E assim foi. E assim continua a ser. Mesmo depois da troika sair, foi-nos prometido que a sua presença continuaria por algumas décadas. Os mercados ficaram logo mais descansados e as pessoas mais desesperadas. A célebre dicotomia o Portugal está melhor, os portugueses é que estão pior.
Mas nada que uma bela operação de charme não resolva. Foi anunciado com pompa e circunstância, o aumento do salário mínimo para €505,00. Pouco importa se esse era o valor (acrescido de uma bonificação de €5,00) que deveria vigorar desde Janeiro de 2011, ou seja quase 4 anos atrás, rasgado que foi o acordo de concertação social assinado em 2006. Mais uma vez se realça o cumprimento das obrigações tão propalado pelo executivo... Mas apenas quando os compromissos são internacionais. Para o povo português a relação de confiança pode ser olvidada vezes sem conta que pouco importa.
Este recente acordo é conseguido à custa de uma redução da TSU para os empregadores de 0,75%. Isto quer dizer que foi preciso lançar uma cenoura aos patrões para conseguir um ridículo aumento que só peca por tardio, num ordenado mínimo miserável. Mas esse valor reduzido na TSU será injectado na Segurança Social através do Orçamento de Estado. Mais uma vez pagamos todos e os de sempre passam entre os intervalos da austeridade. Tenho vergonha de dizer que o dinheiro das minhas contribuições ajudam a perpetuar o "escravizante" Salário Mínimo Nacional.
Faz-se passar a ideia, que este acerto na TSU beneficiará principalmente as micro e pequenas empresas. Nada mais falso! O valor que empresas poupam com esta medida não chega aos €4,00 por funcionário ao mês (como dizia o outro é fazer as  contas). Duvido muito que sejam valores destes que dêem a necessária folga de tesouraria. Em contrapartida os grandes empregadores podem ter aqui um encaixe interessante.
Bastava que este acordo envolvesse outras premissas para que o aumento pudesse chegar facilmente a 40 ou 50 euros. Se em cima da mesa fossem colocados os verdadeiros custos de produção, isto é os custos energéticos e de transportes, estou certo que todas as confederações patronais estariam muito mais dispostas a negociar. Mas falar em baixas de custos energéticos é assunto tabu, pelo menos desde o abandono do Álvaro... Os grandes interesses confortam-se e protegem-se, numa tocante manifestação de solidariedade financeira. 
«Mas olha que €20,00 é melhor que nada...» Ora cá está a "la paliceana" verdade! Depois de anos a fio a diminuir o poder de compra dos trabalhadores, esta afirmação é escandalosa. Anos em que inclusive, alguns grandes grupos económicos aumentaram os seus lucros. Seria pedir muito contribuir um pouco mais para a sociedade, conseguindo-se um aumento do salário mínimo para um nível um pouco mais dignificante? Convém não esquecer que sem dinheiro o povo não consome e um dia o "milagre" das exportações cessa e aí o que farão as nossas empresas?Atenção que o que me choca não é o aumento do salário mínimo em €20,00, mas o facto do mesmo ter ficado congelado quase 4 anos!
A austeridade é a principal responsável pelo aumento das desigualdades e disparidades salariais. Em épocas de crise, as pessoas parecer ser algo descartável. A pressão sobre o mercado laboral é grande demais e assim o determina. É vulgar dizer que uma vida humana não tem preço. Em Portugal, pelos visto, são mais ou menos €20,00...

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

A VIOLÊNCIA VERBAL E O DISCURSO DO VAZIO


“Os homens não têm de ser verdadeiros, têm de fazer sentido.”


O subtítulo está entre aspas porque não é meu… É uma frase “roubada” a André Barata, constante na sua obra Intimigrafia. Não conseguiria de forma alguma transcender-me a tal ponto, pois sou demasiado mundano e agarrado à realidade.
Embora numa primeira leitura esta máxima me parecesse desprovida de lógica, numa observação mais atenta reconheci-lhe uma coerência própria. Com efeito, a descodificação deste conceito leva-me à conclusão de que os homens (ou mulheres) deverão ou ser verdadeiros ou fazer sentido. Dificilmente os homens que forem verdadeiros não farão sentido, pois é algo inato à própria condição. Mas fazendo sentido não quer obrigatoriamente dizer que serão verdadeiros. Até na falsidade pode haver coerência…
Na sociedade actual pululam os exemplos em que não é respeitada nenhuma destas regras. A incoerência é tomada como uma espécie de placebo para todos os males. Os diferentes pesos normalmente usados para quantificar problemas análogos fazem multiplicar a quantidade de balanças, embora a unidade de medida seja invariavelmente a mesma – a violência. Venha ela na forma física ou verbal.
Se na sua forma física, a violência tem sido criticada pela generalidade da sociedade, já a forma verbal é estranhamente tolerada. Talvez no medo constante da cartada da censura ser lançada sobre a mesa. Mas a condescendência com este tipo de reacção faz-nos cúmplices do acto vil que é perpetuado.
O combate ideológico é nobre. O confronto de questões e soluções é fulcral na criação de modelos abrangentes que visem o progresso social. Mas até que ponto a opinião vazia, o discurso desprovido de conteúdo pode ser encarado como positivo num debate que se quer profícuo? Será realmente correcto apelidar de censura o apontar o dedo a estes “sabotadores” ideológicos? A sua retórica resvala invariavelmente para o populismo, a demagogia, o ataque pessoal. Esse é um péssimo serviço à Democracia e um atentado à Liberdade de Expressão.
A violência verbal é, provavelmente, aquela que mais agride. Não falo somente dos impropérios ou injúrias. Com o ataque pessoal é fácil lidar – meter para as costas e continuar o caminho. Agora com o afrontamento ao intelecto por parte do vazio, com a passagem de certificados de ignorância, com a ostentação de uma pretensa superioridade intelectual, já se torna mais difícil. É fundamental parar este discurso verborreico. Pactuar com estes actos não deve fazer parte da filosofia de vida de alguém, por mais que digam que se comprará mais guerras do que se tirará proveitos. Aguentar pacificamente estas atitudes, não é uma opção. Desmascarar a mentira e enfrentar a incoerência deverá ser uma preocupação de toda a sociedade.
Aqueles que eternizam uma discussão até ao fastio sem apresentarem ideias ou tão-somente um fio condutor, nada contribuem para o esclarecimento das inúmeras questões com que a sociedade moderna se depara. Desta forma, violam os princípios do debate honesto e enriquecedor. Estamos perante pessoas que se pautam por uma conduta que certamente não é verdadeira e muito menos faz sentido. Não respeitando qualquer das categorias enunciadas, que espaço poderão ocupar na condição humana?

15 de Agosto de 2014

Miguel Dias

quinta-feira, 7 de agosto de 2014

Declaração de candidatura à Assembleia do LIVRE - 01/Fev/2014

Esta foi a minha declaração de candidatura a membro da Assembleia do LIVRE, no dia 1 de Fevereiro de 2014, no Congresso Fundador no Porto. Passados que estão mais de 6 meses, estas palavras continuam a fazer para mim sentido. Sim, é a tentativa de construção de uma sociedade mais solidária que me trouxe a um papel mais activo no plano político, logo ao LIVRE. Hoje, dia 7 de Agosto de 2014, o meu estado de constante inquietação mantêm-se e enquanto este não for acalmado, não desistirei. Para que a realidade deixe de ser absurda. 

Segue a declaração:
   

Por defeito (ou efeito) de formação, acredito que o caminho para um futuro melhor só pode ser feito através do desenvolvimento do país, mas não um desenvolvimento qualquer. Este deverá ser ponderado e sustentável. A redução de assimetrias e a componente ecológica deverão ser 2 factores fulcrais no modelo a implantar. 
Identificando-me como uma pessoa de esquerda, a faceta social teria de estar presente nas minhas preocupações prementes. Actualmente vivo num estado de constante inquietação. O ataque ao Estado Social, aos Direitos Laborais, às Reformas e Pensões, ao SNS, à Escola Pública e por aí fora deixa-me num desassossego atroz e marca vincadamente um sentimento de injustiça que persegue sempre os mesmos, para beneficiar muito poucos. 
Por tudo isto e muito mais, não consigo continuar parado. É altura de tentar fazer mais do que a crítica e a profecia de ocasião. É preciso dar a cara pelos ideais que defendo (defendemos) e tentar proteger aqueles que não têm voz. Pela defesa de uma sociedade mais justa e igualitária.

domingo, 3 de agosto de 2014

A nova BESta negra da finança nacional

É até provável que o BES consiga o tal aumento de capital e seus índices de solvabilidade estejam protegidos. Beneficiará certamente de capital público (do fundo da troika presume-se, mas suportado por nós), para conseguir se reerguer, e o reembolso dessa verba com juros acabará até por ser um bom "negócio" para o Estado. A intrincada rede de associações financeiras construída ao longo de décadas, fez do banco um monstro que é simplesmente grande demais para deixar cair... 
Paralelamente, a ajuda estatal deverá ser acompanhada de um plano concreto que minimize o impacto do grupo na economia nacional. A voragem a que a sociedade está exposta por situações destas ou análogas, traduz-se numa instabilidade que a economia simplesmente não consegue aguentar.
Mas é mais que sabido, e a experiência tem mostrado isso mesmo, que no dia em que este triste episódio seja esquecido e a crise seja algo do passado, o banco voltará ao seu frenesim orgiástico de práticas financeiras pouco recomendáveis.
Caso não sejam tomadas medidas concretas para a regulamentação do sector da banca e seguros, mais BES(s), BPN(s) e BPP(s) virão, até que seja impossível sair do buraco criado. Interessa também uma entidade fiscalizadora eficiente e que não sofra de "miopia financeira"...

quarta-feira, 2 de julho de 2014

MAIS OU MENOS LIVRE?

Esta era a declaração política que tinha preparado para a 2.º Assembleia do LIVRE, realizada no dia 21 de Junho de 2014. Reflecte a minha posição face aos recentes acontecimentos internos e vincula apenas a minha pessoa e mais ninguém:

É minha firma convicção de que todos aqui somos livres. Quanto à questão de sermos LIVRE, com maiúsculas e tudo, isso já tenho sérias dúvidas… Mas eu ignorante e inexperiente me confesso. Talvez até um pouco tosco… Costumo identificar-me como um taberneiro com alma de passarinho. E se calhar não consigo visualizar tão longe como as minhas asas alcançam. No entanto, hoje faço ouvir a minha voz, para dizer tão-somente que sou LIVRE, com maiúsculas e tudo! Sabemos que a liberdade em toda a sua plenitude, como conceito puro, será sempre uma utopia e, esta sim, impossível de pôr em prática. Portanto, temos de viver o nosso dia-a-dia negociando consensos, respeitando assim as liberdade alheias. Isso também tem de ser verdade no interior do partido. Até porque ele não serve para ser palco para uma uma espécie de competição de egos. O seu propósito é muito maior que isso e não se coaduna com agendas pessoais.
O LIVRE tem uma génese – o Manifesto Por Uma Esquerda Livre – patente nos estatutos no seu Artigo 2.º. E esse Manifesto teve promotores. Entre eles estão André Barata, Marta Loja Neves, Renato Miguel do Carmo e Rui Tavares. Todos estão ligados ao LIVRE e fazem parte dos órgãos partidários. E isto faz todo o sentido. Não podemos olvidar que são eles (entre outros) os primeiros responsáveis por estarmos aqui todos neste dia, a fazer política, a discutir o rumo que queremos para a Democracia. Merecem o nosso maior respeito e admiração e não serem vilipendiados a cada vírgula que expressam, a cada atitude que tomam.
Os órgãos do LIVRE foram eleitos em Congresso de 1 de Fevereiro de 2014. Por sufrágio secreto, sem pressões e, na altura, sem oposição. Em menos de 4 meses trouxeram mais de 70 mil portugueses à sua órbita, numa época em que se fala na descredibilização da política e dos seus agentes. Este resultado nas europeias terá sido uma derrota, no sentido da não eleição de qualquer deputado. Mas pode e deve, também ser encarado como um dado positivo, pois conseguimos arrancar 70.000 eleitores do sofá, convencendo-os a votar LIVRE. Dos Zero aos Setenta Mil em menos de 4 meses! Até dava um bom slogan… Mas o que dá acima de tudo é uma esperança enorme a todos os amadores, ignorantes e inexperientes membros e apoiantes deste partido.
Não me compete a mim fazer juízos de valor sobre as pessoas que constituem o Grupo de Contacto, o Conselho de Jurisdição ou a Assembleia do LIVRE. Deixo para outros tais empresas. A mim move-me tanto a urgência, como os princípios do LIVRE. Já o disse e repito que revejo-me e comprometo-me com todos os documentos emanados do LIVRE e votados pelas suas bases. Nem poderia ser doutra forma. O dever de camaradagem a isso me impele. Estas são as regras que eu aceitei, para entrar neste jogo. Mesmo quando voto vencido tenho de ficar ao lado do LIVRE, por uma questão de princípio. Quem não está disposto a fazer este tipo de cedências terá de fazer um exercício de auto-crítica e aperceber-se do projecto que decidiu abraçar. Ninguém disse que a democracia interna iria ser fácil. Neste ponto tenho uma posição moderadamente radical.
Assim, e partindo do pressuposto que o LIVRE continuará fiel aos seus pilares constituintes: Liberdade, Esquerda, Europa, Ecologia; continuarei com certeza a sentir-me bem num partido onde, espante-se, se sufragam Estatutos e Programas Políticos. Após essa aprovação, essa letra deverá fazer lei entre camaradas. Não pode haver um 2.º caminho nesse ponto. A abertura é total na execução dos documentos, mas depois de emendados, corrigidos e votados, terão de ser respeitados por todos. É claro que haverá sempre espaço para melhorar e enriquecer um ou outro documento. Mas alterações plausíveis deverão ser tratadas da mesma forma. Não é vociferando que isto está tudo mal que poderemos chegar a um qualquer consenso e melhorar as nossas posições. Não é exigindo “respostas musculadas” ao Grupo de Contacto sobre todo e qualquer assunto, e o seu contrário em vários casos em que comunicados são exarados, que se fortalecerá o LIVRE aos olhos dos eleitores. Até porque o partido aparece com o intuito de tentar a convergência à Esquerda e não criar mais ruído ainda. Neste aspecto sou radicalmente moderado.
Chegados aqui hoje percebemos que o LIVRE é de TODOS. Lá fora começam a vislumbrar essa realidade. É um partido feito entre iguais, ao contrário da imagem elitista que nos tentam colar, onde ninguém deverá arremessar o seu canudo a um camarada. É um partido que quer ter uma “relação honesta com o conhecimento” (Carlos Teixeira o diz), mas que deve aplicar igual nível de honestidade nas relações internas de camaradagem. O convívio deverá ser sensato e cordial, que não é o mesmo que dizer que nos devemos pautar pela falsidade e hipocrisia. Não! As críticas são para ser feitas em local próprio, olhos nos olhos. Deste processo surgem invariavelmente soluções mais ricas e duradouras. Por o LIVRE ser de TODOS, deixou de ser aquilo que nunca foi – o partido do Rui Tavares. Desculpa-me camarada, mas esse barco já zarpou e estou certo que não deixa qualquer espécie de saudosismo em ti. O LIVRE é um partido, como já disse que não se revê nesta lógica de liderança. Não é do Rui Tavares, tal como não poderá vir a ser de ninguém. O LIVRE é a “Cantiga da Rua” do espectro político nacional. Não pode ser um veículo para propalar ambições pessoais. É democrático demais para sofrer com estes tipos de tacticismos. O LIVRE tem órgãos próprios e estruturas eleitas. É dirigido por uma equipa de 15 pessoas, denominada por Grupo de Contacto. Fizeram, fazem e farão o seu melhor em prol do partido e essencialmente do que ele representa. Dir-me-ão que o seu melhor não é suficiente. Respondo que o tempo será o melhor juiz nessa matéria. Quando chegar ao fim do seu mandato, o Grupo de Contacto será sufragado pelo trabalho que desenvolveu e nós seremos os avaliadores. Por isso sou frontalmente a favor de um Congresso Ratificativo que legitime as decisões tomadas democraticamente e frontalmente contra um Congresso Electivo que atrase a implantação do LIVRE na sociedade.
Alguém já me disse que o grande problema do LIVRE é a sua enorme abertura. Efectivamente, a sua maior virtude poderá ser também o seu maior defeito. Mas eu acredito, e quero continuar a fazê-lo, que estou entre pares. Quero continuar a acreditar que os camaradas que aqui estão põem o interesse do LIVRE, acima do seu interesse pessoal. Quero continuar a acreditar que ambicionamos para o país, mais e melhor Portugal. Por continuar a acreditar em tudo isto, e estar firmemente convicto que o LIVRE é um projecto de superior interesse nacional, eu não trocaria a nossa forma de fazer política por nada!

Viva o LIVRE!

Montijo, 19 de Junho de 2014

Miguel Dias

sábado, 31 de maio de 2014

Conversa LIVRE dia 29 de Maio de 2014 - Uma conversa sem espiga

Foi com alguma alegria que constatei que não tive oportunidade de intervir na reunião informal do passado dia 29, na sede de campanha do LIVRE. Isto por duas ordens de razão. Primeiro porque a sala estava composta e muita gente quis usar da palavra (o que é sempre bom). Segundo pela minha conhecida capacidade de fazer amigos (sempre que falo algumas pessoas ficam melindradas). De resto, o que teria para dizer não seria um grande acrescento ao que foi adiantado naquele final de tarde de espiga. De qualquer forma, deixo aqui um esboço das ideias que pretendia explanar.

1. O resultado eleitoral - É uma derrota não termos conseguido eleger. Pessoalmente reconheço a minha quota-parte nesse fracasso e já fiz o meu exercício de auto-crítica. Deveria ter me envolvido mais na campanha e ter tentado passar mais a palavra, naquilo que gosto de chamar "pedagogia política de proximidade". Coisas a corrigir no futuro. A não eleição de um ou mais eurodeputados deixou cair por terra o esforço e sacrifício de todos os candidatos e de quem se envolveu na campanha. Só posso apresentar as minhas desculpas, sem no entanto deixar de frisar que quem mais perde é Portugal e o próprio Parlamento Europeu.
Outra questão é o número total de votos que tivemos e a sua realidade em alguns territórios. Nesse campo considero que os mais de 70.000 votos, para um partido com tão pouco tempo de existência e ausência quase total de estrutura, é um início auspicioso.

2.  Adjectivação / Caracterização do LIVRE - Fazedores de opinião das mais variadas origens tentam passar a ideia de que o LIVRE é um partido de elitistas e intelectuais; um partido fechado; um partido unipessoal. Só nenhum se lembram de identificar o LIVRE como um partido de Esquerda, Progressista e defensor de um Memorando de Desenvolvimento para o país, sempre baseado na sustentabilidade. O LIVRE faz também parte da tal Esquerda caviar. A mim irrita-me solenemente esta classificação, até porque nem tenho posses para adquirir tal produto... 
É essencial dar a conhecer o Partido - explicar que o LIVRE é um partido diferentes. Eu costumo dizer que somos um partido de cidadãos e para os cidadãos. Um partido que aposta tudo na democracia, primeiro internamente com a democracia deliberativa e participativa, e depois pela abertura à sociedade, as reuniões são por princípio públicas e os candidatos escolhidos por todos em primárias abertas.
Tudo isto tem de ser escalpelizado, processado e divulgado.

3. Internamente tenho ouvido criticar o partido pela falta de mobilização na campanha e que precisaria de incentivar a criação de núcleos territoriais. Mas o que me chateia é a falta de iniciativa por parte de muitas das pessoas que lançam esta crítica. Somos nós, membros e apoiantes, que temos de criar esta dinâmica e contribuir para o crescimento do LIVRE. Ando já à algum tempo à procura de simpatizantes do LIVRE no Montijo para a formação de um Núcleo Territorial, o que se tem revelado uma tarefa hercúlea. Mas não estou pronto a desistir ou baixar os braços. Continuarei a tentar. E é mesmo isso, continuar sempre a tentar, o que deve ser pedido a cada um de nós. Quem diria à 6 meses atrás que neste momento estaríamos a discutir o resultado que registámos nas Europeias e o que temos de fazer para as Legislativas.

4. Num futuro muito próximo os núcleos territoriais serão muito importantes num cenário legislativo. A nossa bandeira - as primárias abertas - terão de ser descentralizadas até por força do tipo de eleição que enfrentamos, por círculos e que terá de ter várias listas distritais. Os núcleos territoriais serão essenciais no suporte e realização destas primárias.

5. Para que o partido possa crescer de forma sustentada são precisos fundos. Chegou a altura de pensar seriamente na criação de uma quota mensal para os membros do LIVRE. Não poderá ser certamente de valor elevado, até porque ao contrário do que se apregoa, o LIVRE constituído por uma elite abastada, e não pode ser uma razão para afastar os actuais membros ou inibir a inscrição de futuros. Farei chegar uma proposta ao Grupo de Contacto para estudo.

É tempo de unir forças e meter as mãos na massa. Eu não diria que será altura de arregaçar as mangas, pois neste partido nunca fizemos as coisas doutra maneira. LIVRE um partido de mangas arregaçadas! 

sábado, 24 de maio de 2014

O Cepticismo Dominante - Manual de Instruções Para Convencer Um Céptico Militante

Amiúde é assim... Em conversa com as pessoas, o assunto vai invariavelmente dar ao estado a que o país chegou, logo ao fenómeno político. Um amigo em particular é insistente em inquirir sobre a acção do LIVRE - o porquê e o para quê do partido. É um interesse genuíno. Este indivíduo em concreto, quer saber mais do LIVRE, o que o diferencia, quais os seus intentos. Invariavelmente, sinto que fico aquém das expectativas. Como passar a mensagem?
Apresento os quatro pilares de sustentação do projecto político: Liberdade, Esquerda, Europa, Ecologia - demasiado vago. Aceno com o programa político às eleições europeias, constituído pelas suas 67 medidas para mudar mesmo a sério a Europa - demasiado específico.
É essencial descobrir um meio termo que, de forma cabal e inolvidável, esclareça a essência do LIVRE e porque vale a pena (voltar a) votar no próximo dia 25 de Maio. 
O porquê e para quê do LIVRE, já foi mais que esmiuçado nas diversas intervenções de Rui Tavares e restantes candidatos, sendo inútil e contraproducente vir explicar de novo essa matéria, até porque nunca me aproximaria à excelência do discurso neste humilde texto. Portanto, interessa aqui compilar de uma forma simples e objectiva um manual de instruções que possa convencer um céptico militante. 
Passo de seguida a enumerar 10 razões para apostar no LIVRE já no próximo acto eleitoral:

  1. O LIVRE é um partido novo, não só pelo tempo de existência, mas acima de tudo pela nova forma de fazer política;
  2. No LIVRE não existe um dirigente único, a direcção do partido é composta por 15 pessoas, designada de Grupo de Contacto, com um porta-voz rotativo;
  3. Todos os documentos basilares do LIVRE, desde os seus estatutos ao programa político para as Eleições Europeias foram escritos a várias mãos e são sujeitos a um período de emendas e votação. A democracia começa dentro do partido num esforço deliberativo que enriquece sobremaneira os conteúdos;
  4. No LIVRE não há lugares cativos nem se pratica a política por convite. Qualquer cidadão pode concorrer a primárias abertas e dessa forma ser escolhido como um dos personagens políticos para a eleição em causa. Um processo de abertura que dá voz ao cidadão anónimo, que não raras vezes tem ideias válidas e que só espera uma oportunidade;
  5. No LIVRE a defesa e cumprimento da Constituição da República Portuguesa é ponto fulcral, pelo que não há, nem nunca poderia haver, disciplina de voto. Um cidadão eleito pelas listas do LIVRE tomará sempre a decisão que a sua consciência ditar, não defraudando assim os eleitores que lhe confiaram o voto;
  6. O LIVRE acredita que só através de políticas de índole progressista poderemos arrancar o país do marasmo em que se encontra, começando já por tentar aplicá-las no parlamento europeu, de onde emanam actualmente a maioria das nossas leis;
  7. No LIVRE não acreditamos no crescimento a qualquer custo. Este deve ser sustentado, respeitando o ambiente e a gestão dos recursos naturais;
  8. No LIVRE defendemos políticas activas de combate às alterações climáticas, sempre na persecução de deixar um Mundo um pouco melhor do que aquele que recebemos;
  9. O LIVRE propõe um programa eleitoral ambicioso, extenso, mas que pode ser exequível. Um eurodeputado do LIVRE é um garante que tudo fará para que esse trabalho se realize.
  10. O LIVRE acredita numa Europa mais justa, mais democrática, mais solidária. Um voto no LIVRE é uma garantia de luta sem tréguas na mudança de rumo e na construção de um projecto europeu inclusivo, no qual não haja parentes ricos e parentes pobres. A periferia deve deixar de ser subjugada aos ditames do norte da Europa, numa espécie de tirania financeira, que a médio/longo prazo será prejudicial para todos.
Resumo desta forma a importância de no próximo domingo votar LIVRE. O futuro europeu está nas nossas mãos e nós sonhamos ser donos do nosso futuro. Para arrepiar caminho é necessário primeiro escolher a direcção certa. O LIVRE avança com os primeiros 67 passos, a partir daí o caminho faz-se andando...

sexta-feira, 25 de abril de 2014

Consenso e Alternância

É preciso consenso! Consenso para acabar com o Estado Social. Consenso para extinguir a Escola Pública e exterminar o Serviço Nacional de Saúde. Consenso para privatizar os correios e os transportes públicos, a água e a electricidade. Consenso para dificultar ainda mais o acesso a bens essenciais por parte do povo que os elege. É preciso consenso para aplicar um modelo económico que em nada favorece o país. Para manter uma moeda única que nos arrastou para o bueiro, jamais discutindo a sua arquitectura ou reformulação. Consenso para nada esperar e obedecer cegamente a uma ditadura financeira que nos é externamente imposta. 
É preciso consenso para sermos inertes. É preciso consenso para fingir agitar tudo, deixando no fundo tudo na mesma...
Mas agora é preciso mais. É preciso alternância! Atenção: não confundir alternância com alternativa. Este último termo é demasiadamente democrático.
Alternância entre um PSD, que de social democrata só ostenta a denominação, e um PS, que se disfarça de socialista. Com ou sem a muleta política do CDS, que apregoa aos quatros ventos os seus princípios morais, mas rapidamente os esquece quando chega ao poder, envolvido sempre em sombrios esquemas irrevogáveis.
A alternância que nos conduziu a este estado de coisas. A alternância entre empobrecer e "ajustar", entre "flexibilizar" ou despedir. A alternância entre o injustificável e o incomportável. A alternância entre um governo cego e um governo autista. A alternância entre cortar ou delapidar.
A alternância que nos trouxe à descredibilização dos partidos políticos e às dúvidas que pairam sobre o próprio sistema democrático. Essa alternância não serviu, não serve e não servirá aos portugueses.
Mas existe uma alternativa. Que se crie um consenso natural em torno do único documento transversal a todo o espectro político nacional - a Constituição da República Portuguesa. E se todos os agentes políticos respeitarem este documento fundamental, que juraram defender, a alternância será mais ou menos pacífica.
Quando o consenso e a alternância se fizerem no âmbito da Constituição, poderemos finalmente concretizar Abril.

quarta-feira, 12 de março de 2014

Cores Primárias


No ar sentia-se o peso da história, pelas 11 horas de Domingo, dia 9 de Março de 2014, ao Teatro do Bairro em Lisboa. Cerca de meia centena de membros do LIVRE esgrimiam argumentos em torno do ponto que era o cerne daquela Assembleia – o Regulamento das Primárias Abertas, uma das bandeiras deste futuro partido. Houve discussão e diálogo,correcções e emendas, explicações e convergências. Assim se fazia Democracia. Isso mesmo Democracia com maiúscula e tudo! No seu estado mais puro, participada e deliberativa. Todos têm direito a ter uma voz na execução dos documentos do partido, apresentando propostas e soluções alternativas, votando-se num final uma versão devidamente consolidada. Um modo diferente e envolvente de fazer política.

Entre espaços observava os semblantes que me rodeavam, vislumbrando nestes alguma ansiedade, mas acima de tudo orgulho. Ansiedade, decorrente da enorme responsabilidade que pende sobre os ombros de todos nós, por ensaiarmos e estarmos prestes a levar a cena, a primeira experiência de Primárias Abertas a nível nacional. Todos têm a noção de que tudo terá de correr pelo melhor; se queremos que este tipo de solução seja o futuro democrático tem de ser transmitido um cunho de credibilidade inabalável. Orgulho, pelas mesmíssimas razões. Seremos os primeiros a levar a cabo Primárias Abertas a nível nacional, no caso concreto para a constituição da lista de candidatas e candidatos às Eleições Europeias. Haverá coisas que correrão mal? Possivelmente. E nessa altura os abutres de serviço, e que normalmente comem do prato dos interesses partidários instituídos, não hesitarão em atacar este processo, tentando perpetuar a política por convite tão folclórica no nosso Portugal. Mas não abdicaremos desta premissa. Existe demasiada força na esperança que nos une e uma profunda convicção de que este será um passo fundamental para devolver a confiança na democracia a todos os cidadãos.

Embora todas as candidaturas devam estar em consonância com os princípios e programa político do LIVRE, o que se pretende com este processo é que a lista concorrente à votação do dia 25 de Maio deste ano para o Parlamento Europeu não se feche no próprio partido. Só duma forma aberta e apelando à participação de independentes, poder-se-á convocar a sociedade civil para participar no processo eleitoral. Todos poderão participar como eleitores no processo de Primárias, independentemente de serem ou não membros ou apoiantes do LIVRE. No fim, os candidatos deverão obedecer à vontade expressa pelo voto. 

E é deste modo que se tentará pintar o quadro das primeiras Primárias Abertas em Portugal. Se será em toques de impressionismos ou abstractos é talvez muito cedo para saber. Mas uma coisa é certa: a Democracia mesmo a sério começou ontem. E colorir-se-á, impreterivelmente, de cores primárias...

10 de Março de 2014
Miguel Dias 

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

A realidade é muito absurda


Várias vezes me perguntei o porquê de só agora sentir urgência de activismo. Isto porque as questões em torno das incoerências e injustiças sociais sempre me tocaram sobremaneira. Inquietação é o estado de espírito que melhor reflecte as minhas preocupações e anseios. Não deixa de ser curioso, e a meu ver extraordinariamente sensato, de ter sido nas páginas de um livro de Mário de Carvalho – “Era bom que trocássemos umas ideias sobre o assunto” – que esbarro com a resposta a esta pergunta... Às páginas tantas, num diálogo à mesa de almoço entre o advogado Carmo Velho (militante partidário) e Joel Strosse (burocrata cinquentão de uma Fundação e proponente ao Partido), o primeiro inquire sobre o porquê de só agora, volvidos tantos anos do 25 de Abril, ocorrer esta tomada de decisão. Joel responde simplesmente: “- Acho que já estou preparado!”
Precisamente. O activismo, a militância, necessitam de tempo de construção. A transferência da contestação para o espaço público, o dar a cara pelo que se acredita, o defender as nossas ideias, implica um certo amadurecimento. A eterna demanda de colocar as questões e soluções sempre na devida perspectiva.  Mas neste dado momento, a urgência pode atropelar um pouco o tempo necessário a este processo e mais ou menos preparados teremos de confirmar a presença.
Não sei se causará grande transtorno, mas dadas as circunstâncias não me sinto preparado para rolar e fazer de morto, como nos é solicitado pela narrativa da ausência de alternativa. Aliás, nunca fui muito dado a esses números circenses de cãezinhos amestrados. Decididamente, essa não é minha vocação. Quero também ter voz no debate que gira em torno das opções para o país, do rumo que devemos escolher, do contrato social que se esfuma e do Estado Social que se desmorona. Já não me chega, nem deveria chegar para nenhum de nós, limitar a intervenção democrática às domingueiras eleições. A democracia na nossa sociedade faz-se desde a reunião de pais e encarregados de educação, à Assembleia da República. Do local de trabalho, à manifestação de rua. Nenhum debate é menor e nenhum espaço menos digno. A participação no processo democrático implica aparecer, opinar, colaborar, dialogar, ponderar. E acima de tudo lembrar que em democracia há sempre alternativa.
A realidade assim nos solicita e cada vez mais nos convoca para participar, conforme as nossas capacidades e aptidões, na reformulação e redesenho do país. Um país que se quer mais democrático, mais solidário, mais respeitável. Um país esculpido por um povo honesto e trabalhador, que deve exigir que gente séria nos governe, ao contrário desta corja de malfeitores que sequestraram a democracia e a mantêm refém de uma dívida impagável, que hipotecará o futuro das gerações vindouras! A realidade neste momento específico chama-nos a tomar partido. A abstenção, a ausência de opinião, é um luxo muito acima das nossas possibilidades e implica a contínua destruição do que foi edificado em 40 anos de democracia. A realidade está patente numa rua perto de nós, entra-nos pelos olhos adentro e aloja-se no nosso âmago. Nos tempos que correm, e recorrendo mais uma vez à citada obra de Mário de Carvalho, “A realidade é muito absurda...”


Miguel Dias
24 de Fevereiro de 2014

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

LIVRe - "a sério" (Congresso Fundador)

Isto era o que eu levava preparado para o Congresso Fundador do LIVRe, na cidade do Porto nos dias 31 de Janeiro e 1 de Fevereiro de 2014. Como a leitura deste texto chegava aos 5 minutos e apenas tínhamos 3 minutos disponíveis por cada pessoa tive de apresentar uma variante editada, mas mantendo a sua essência, logicamente. De seguida deixo-vos o texto na íntegra:

LIVRe - "a sério"
Como nunca me ocorre nada de particularmente inteligente ou significativo para dizer nestas ocasiões, socorro-me das palavras de outrem, que embora singelas, não deixam de ser pertinentes. São elas, simplesmente: "a paz, o pão, habitação, saúde, educação"; que Sérgio Godinho canta há 40 anos, tantos como os que temos de Liberdade. Elas não são mais que os direitos básicos fundamentais a que qualquer ser humano deveria ter acesso. Cabe às sociedades modernas facilitar e democratizar esse acesso. Mas o poeta diz mais. Afirma que “só há liberdade a sério quando houver, liberdade de mudar e decidir”. Este é o momento de sermos Livres, este é o momento em que decidimos mudar.
Não há que ter medo da noção e da construção de uma sociedade mais igualitária e solidária. Não falo aqui das repúblicas populares comunistas ou socialistas que no século passado falharam em larga escala. O Kimilsunismo, o Maoísmo, o Estalinismo e outras, não foram mais do que interpretações erradas ou abusivas do Marxismo e que na prática, de social e da justiça da luta de classes, poucos resultados tiveram. Outros vieram a seguir que enfiaram Marx na gaveta, numa estranha vergonha de mostrarem uma costela solidária ou socialista.
Paradoxalmente foi a social-democracia, inspirando-se em várias filosofias e movimentos ideologicamente de Esquerda, a iniciar a construção de um modelo social europeu, que se baseia numa distribuição mais equitativa dos recursos e na defesa dos mais desfavorecidos. A Direita cavalgou nesta onda, fazendo da tentativa de atenuar a diferença entre as classes sociais uma sua bandeira. Por cá, a Direita que se diz apoiante deste modelo, assaltada que foi por um neoliberalismo feroz, desmantela o Estado Social como se este não passasse de um navio condenado a sucata num qualquer estaleiro naval. A nova panaceia para a resolução dos nossos problemas económicos parece ser uma mudança de paradigma, traduzida numa alteração de regime. Quer-se substituir a democracia representativa por uma espécie de democracia corporativista, onde quem determina as directrizes da economia nacional são meia dúzia de merceeiros que podem perceber muito de pagar impostos na Holanda ou no Luxemburgo, mas que não conseguem entender que não é criando um país em clima de saldos e um estado social em constante promoção que se construirá uma economia forte e com potencial de crescimento. Também os Mercados não entendem isto e o Governo nada faz para o explicar, cúmplice e crente da política activa de empobrecimento, baptizada de Ajustamento.
A Esquerda, nacional e europeia, assiste atónita a tudo isto e assim continua, numa altura em que a Direita extrema posições. A aposta agora é na destruição de tudo o que é público e do próprio Estado Social, na desregulamentação da economia e no esvaziamento dos direitos laborais. Está patente uma ofensiva sem precedentes aos sindicatos, na qual se tenta fazer passar a ideia de que estes são uma força de bloqueio ao desenvolvimento do país, ao contrário da sua verdadeira essência, a defesa dos direitos dos trabalhadores e o garante da tentativa secular de diminuir as desigualdades. A este ataque chamam Flexibilização.
Portugal fez congressos, debates, reuniões e mesas redondas. Assistiu às maiores manifestações populares de que há memória. Reuniu-se em grupos de trabalho e de estudo sobre as soluções alternativas para a crise. Sindicatos organizaram-se em greves, gerais e sectoriais, e em passeatas. Curiosamente nada disto parece ter surtido efeito. Talvez por duas ordens de razão. Primeiro a sociedade actual, extremamente mediatizada, vive mais do efémero do que do conteúdo. A manifestação que hoje é notícia para os grandes meios de comunicação social, amanhã é passado e nós contribuímos para esta situação, pois ficamos todos a aguardar a “next big thing” ao invés de potenciarmos o movimento actual. Somos coniventes também por não pensarmos o dia seguinte e a continuação do protesto. As coisas parecem ter um início, uma realização e um fim, quando deveriam ser perpetuadas e ligadas entre si. Isto leva-me à segunda razão. As formas de luta e de protesto, os fóruns e as alternativas apresentam-se como compartimentos estanques, vedados a qualquer influência ou contacto externo. Os sindicatos não se unem às associações e os partidos não falam com os movimentos inorgânicos. As manifestações são vistas como passeios em massa, as greves como queixas de quem não quer é trabalhar. Quando o que teria real interesse era unir todo este movimento e transformá-lo numa enorme onda de fundo, com o necessário apoio emanado de uma sobressaltada sociedade civil. Também no protesto é essencial falar de convergência.
Parece-me assim lógico que nesta encruzilhada histórica, só através da congregação das forças, do diálogo, da união, da convergência, poderemos escolher o caminho certo. Se essa convergência será conseguida por uma papoila que teima em brotar independentemente do clima adverso e do solo infértil, é talvez muito cedo para dizer. Mas não posso, não podemos deixar de tentar! Recuso render o meu país a uma corja de malfeitores, que insiste em terraplanar tudo que foi arduamente construído ao longo de 4 décadas, para depois reerguer um edifício inspirado numa arquitectura neoliberal, onde apenas cabe 1% da população, nivelando por baixo e empurrando para a pobreza os restantes 99% do povo.
Este é o momento histórico para a convergência. Este é o momento de tentar o que nunca foi conseguido neste país – uma real política de Esquerda. O tempo para uma Democracia moderna, onde a sílaba tónica esteja na vertente social, não descurando para tal um desenvolvimento sustentável, equilibrando sempre o ecológico e o económico. O tempo de lutar pela Paz Social e o Pão para todos. A altura de defender os direitos, constitucionalmente estabelecidos, à Habitação, à Saúde e à Educação. Só assim conseguiremos viver em Liberdade mesmo, mesmo, a sério...

31 de Janeiro de 2014

terça-feira, 28 de janeiro de 2014

NACIONAL PORREIRISMO

Não é costume meu embarcar em generalizações. Elas são, na maior parte das vezes, injustas e perigosas. No entanto, toda a regra tem uma excepção e neste caso não há como escapar às abstracções. Todos nós gostamos de ser tratados como gajos porreiros e identificados como tal. O Nacional Porreirismo é um modo de estar e mais do que isso uma filosofia de vida. Todos almejam o epíteto de pessoa porreira, mas desejam ainda mais o tratamento nas palminhas das mãos e com a habitual benevolência de um nacional porreirista...
O Nacional Porreirismo, aplicado no plano laboral, aquele que me interessa falar, acarreta dois problemas essenciais:
1.   Quando condescendemos demais “comem-nos as papas na cabeça”;
2.  Quando não condescendemos somos invariavelmente uns “chibos” ou, pior ainda, uns “filhos de... meretrizes”.
A bitola é esta e não existe zona cinzenta. Ou somos os maiores do porreirismo ou não valemos um “chavelho”. Também podemos variar na escala do porreirismo, consoante o dia e a decisão tomada, tipo bolsa de valores. Hoje podemos estar em alta e amanhã cair a pique. São exemplos disso o famoso: “aquele gajo?! Aquilo é cinco estrelas. Atrasei-me de manhã e ele nem me deu um raspanete” para casos positivos; ou o usual: “o gajo não vale népia! Só por me ter enganado no formulário e enviado o produto sem querer para o Sri Lanka ao invés da Noruega, levei uma descasca daquelas” para situações negativas.
O Chico-Esperto é o mamífero que, por princípio, se movimenta melhor neste ambiente. Tem a capacidade sui generis de identificar à légua os tansos que se deixam manobrar. Os tais gajos porreiros que pouco ou nada exigem ou dizem, para quem está sempre tudo bem e que o melhor mesmo é não levantar ondas. Para o Nacional Porreirismo esta malta vale ouro, porque ambiciosos ou não, esta classe encobre problemas e deixa as coisas rolarem numa eterna e desgastante incompetência melancólica.
É na exigência e na confrontação que o Nacional Porreirismo normalmente se expressa em toda a sua magnitude. Quando há uma necessidade de resultados e se impõem metas, as pessoas quase instintivamente adoptam uma posição defensiva logo à partida, para a eventualidade de alguma coisa falhar. O “sacudir a água do capote”, o “errar é humano”, o “uma mão lava a outra” ou o “bode expiatório”, são técnicas evasivas usuais. Um constante corrupio de desculpas para as nossas próprias falhas, descartando assim responsabilidades. Quem alinha com este diapasão e encarrila neste discurso é considerado um gajo porreiro, pá! Do melhor que o Nacional Porreirismo pode oferecer. Mas estas pessoas são na verdade cúmplices que ajudam a enterrar uma culpa que, invariavelmente, morre solteira e sozinha.
Quando uma obra de construção civil está atrasada há sempre versões contraditórias entre os agentes intervenientes, num esquema que funciona género “pescadinha de rabo na boca”. Mal julgamos ter chegado ao fim, deparamos que acabámos efectivamente no mesmo sítio. Interpelado sobre o atraso, o Engenheiro vai descartar culpas para o Capataz e para os burocratas camarários. O Capataz, por seu lado, diz que a culpa é do Pedreiro e do Engenheiro que anda sempre com contas. O Pedreiro vai onerar o Capataz por não lhe dar o material a tempo e horas e o Engenheiro, embora nem saiba ao certo qual o trabalho deste. Provavelmente, todos irão também imputar responsabilidades às condições climatéricas; porque no Inverno chove e no Verão faz calor. São uma porra as Estações do Ano... Sistematicamente, o resultado deste tão português episódio é sempre o atraso de meses ou anos na finalização da obra e a habitual “derrapagem financeira”.
Quem não quer e não aceita pactuar com este tipo de situação, passa obrigatoriamente para o campo da confrontação. E neste campo não há quartel. Alguém que chame outrem à responsabilidade por um erro ou um esquecimento, tem prometida uma guerra interminável. A cultura da exigência e da responsabilização não encontra eco no Nacional Porreirismo. Alguém que responda pelos seus actos, leal, frontal e que solicite o mesmo dos demais que o rodeiam terá um sério problema dentro da nossa estrutura laboral. Quem pensa que este é um fenómeno restrito à relação chefe / subalterno, desengane-se. Obedece a uma lógica transversal, vertical e horizontalmente falando, e tem sempre dois sentidos.
Quanto a mim, muito sinceramente, quero essencialmente ser um gajo justo. E sei que isto é pedir muito, pois o critério de justiça encerra em si mesmo alguma subjectividade. No entanto, se no fim da jornada conseguir fechar os olhos e adormecer , isto significa que não estarei muito longe desse objectivo. Se assim for... Tudo estará porreiro, pá!

28 de Janeiro de 2014
Miguel Dias